ISBN: 978-85-63552-24-2
Título | Sujeitos à margem e exílio no cinema latino-americano contemporâneo |
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Autor | Bárbara Xavier França |
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Resumo Expandido | Um dia na vida de um lenhador. Em La Libertad (Lisandro Alonso, 2001), Misael realiza tarefas típicas do cotidiano de um trabalhador dos rincões dos Pampas, tais como cortar árvores, matar um animal para se alimentar, preparar o almoço, ouvir o noticiário no rádio e vender a madeira obtida. Do mesmo diretor argentino, em Los Muertos (Lisandro Alonso, 2004), Vargas, recém-saído da prisão, atravessa a inóspita região das ilhas, na província de Corrientes, em busca de algum parente sobrevivente. Ele matara todos os seus irmãos, e seu processo de retorno ao lar da filha é marcado pelo puro fazer: andar, caçar, comprar, transar, remar. Explorando o universo do trabalho, Mundo Grua (Pablo Trapero, 1999), apresenta um mundo de engrenagens de uma empresa qualquer. Nela, trabalha Rulo, que interage nesse ambiente vertical e, pode-se dizer, suspenso. Demitido por excesso de peso, o personagem consegue um novo emprego e viaja para um lugar desconhecido. Também realizado por Trapero, El Bonaerense (2002) traz Zappa, serralheiro de uma pequena cidade que, porque acusado de roubo após abrir um cofre sob o comando de seu patrão, é levado para Buenos Aires com o objetivo de escapar da prisão. Lá, ele passa a fazer parte de uma instituição policial considerava a mais corrupta da capital argentina. Associados ao que tem sido chamado de “minimalismo expressivo” do cinema argentino do século XXI (Prysthon, 2015), os filmes de Lisandro Alonso e Pablo Trapero compartilham do interesse por planos que duram, pelo silêncio das cenas, pela quase ausência de som extradiegético, pelo argumento aparentemente simples ou pouco delimitado e por personagens “menores” – longe dos grandes líderes − que, na maioria das vezes, são representados por atores não profissionais. No caso de La Libertad, Los Muertos, Mundo Grua e El Bonaerense, especialmente, a aproximação se dá ainda pela escolha por protagonistas solitários, que, em sua errância no mundo – seja procurando emprego, sendo obrigado a se mudar, procurando um lar de outrora, procurando clientes para seus produtos – estão sempre à margem: do Estado, da economia, do Direito. Suscitadas pelo contato com as obras, ausência, isolamento, procura por uma origem e impossibilidade de retorno são eixos que sugerem, mesmo que de maneiras distintas, a presença de uma mise-en-scène da condição do deslocado ou, ainda, do exilado. Com o interesse voltado para as escolhas (formais, estilísticas, narrativas) que se dão no interior do plano, acredita-se que a relação fundamental estabelecida entre espaço e sujeitos nesses filmes, dando a ver uma expressão do inóspito, do entre-lugar e do não pertencimento, conduza ao conceito de exílio. Tomado em seus múltiplos sentidos, sejam políticos, históricos, existenciais, sociais ou econômicos, o exílio é um tema recorrente na produção cultural latino-americana e também considerado aspecto constituinte dos discursos acerca do que significa ser latino-americano (Gomez, 2013). Procurando elaborar a experiência dos regimes totalitários e das violências de estado sofridas, o cinema produzido entre as décadas de 1980 e 1990 na região trouxe a temática do exílio com a exploração de emblemas e da nostalgia de uma ideia totalizante da nação. Com uma perspectiva comparativa, o trabalho coteja o chamado de “cinema de transição” às obras de Trapero e Alonso, percebendo estratégias que apontam para “novas representações do exílio” (Gillone, 2015), marcadas pela estraneidade dentro das próprias fronteiras nacionais. A partir dos filmes dos diretores argentinos e de sua lida com condições comuns a grande parte dos países da América Latina, tais como a modernização conservadora, a instabilidade com relação aos governos e economias − que tem produzido cada vez mais alijados de sua terra −, a permanência de situações de exceção e uma irresolvível orfandade, percebemos o exílio como linha de força para pensar cultura, política, violência e pós-ditadura na contemporaneidade. |
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Bibliografia | ANDERMANN, J. La imagen limítrofe: naturaleza, economía y política en dos filmes de Lisandro Alonso. Estudios 15: 30. Pp. 279-304, julio/diciembre. 2007. |