ISBN: 978-85-63552-26-6
Título | O Espírito da Mídia: assombrações digitais no cinema de horror |
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Autor | Klaus Berg Nippes Bragança |
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Resumo Expandido | “Existem agentes físicos, por ora desconhecidos, que mais tarde se tornarão comuns. Trata-se de um fenômeno bastante simples, semelhante a uma fotografia, combinada com forças que ainda não descobristes”. Espírito do Sr. Badet evocado na sessão da Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas em 15 de junho de 1858. A edição número 7 da Revista Espírita de julho de 1858 apresenta a polêmica notícia “Uma Nova Descoberta Fotográfica” em que descreve a controvérsia gerada pela formação espontânea da imagem de um senhor recém falecido na vidraça da janela de sua casa. A viúva só havia constatado a imagem espectral após a morte de seu marido e confirmou que a janela era o local onde o Sr. Badet ficava constantemente para observar a rua. Assustada com o fenômeno a viúva removeu e destruiu a vidraça da janela que continha a imagem do finado. Para resolver a polêmica os editores da revista relatam ter evocado o espírito do Sr. Badet para perguntar-lhe se a imagem revelada na vidraça era de ordem sobrenatural. O espírito desmente a especulação e pondera que a formação de sua imagem se deu ainda em vida, uma reação provocada pela incidência rotineira da luz sobre o vidro e o contato com agentes atmosféricos desconhecidos. A notícia averigua um fenômeno natural que foi compreendido como sobrenatural, recorrendo inclusive ao espírito do falecido para esclarecer o fenômeno – mesmo que o próprio não tenha certeza sobre o ocorrido, pois como a própria notícia nos lembra, “os Espíritos, ao contrário do que se pensava outrora, longe estão de tudo saber” (2004, p.282). Trata-se de um erro de interpretação cometido pela viúva, uma marca que acompanha a representação fantasmagórica no cinema. Jeffrey Sconce (2000) defende um vínculo muito estreito entre médiuns e mídia, pois no seio do movimento espiritualista havia a crença da comunicação com os mortos. Ainda no século XIX com a consolidação de comunidades espiritualistas, a fotografia espírita se difunde pelas cidades e é recebida de maneira ambivalente: como prova material da existência do mundo sobrenatural e como uma fraude criada tecnicamente. Para Simone Natale (2012) a ambivalência era provocada por um efeito técnico já conhecido entre as atrações e entretenimentos da modernidade: dupla exposição fotográfica e sobreposição de imagens. Évocation Spirit (1899), curta de Georges Méliès, traduz bem o efeito: uma moldura redonda sobreposta ao cenário apresenta imagens espectrais das pessoas evocadas por Méliès – inclusive ele mesmo. Cada nova tecnologia de mídia parecia inspirar a imaginação e as práticas do movimento espiritualista, da fotografia ao telégrafo, do rádio à televisão. De maneira similar a tecnologia inspirou novas representações fantasmagóricas para o cinema de horror. Steffen Hantke (2015) traça um percurso da visibilidade nos filmes de fantasmas desde o cinema clássico até a entrada do CGI na produção audiovisual e, para ele, o CGI configura a imagem como um “significante meta-textual” (p.195). Assim, muitos filmes deste começo de século recorrem às novas tecnologias de mídia para compor suas representações sobrenaturais a partir de efeitos visuais digitais – embora a maior parte não articule a tecnologia de mídia ao horror espectral. Diferentemente, filmes como Lake Mungo (2008), Sinister (2012) e Sx_Tape (2013) oferecem um conflito entre gerações de mídia que convivem juntas: mídias tradicionais invadem novas mídias como se fossem fantasmas analógicos que assombram a tecnologia digital. Para Marc Olivier (2015) uma característica de linguagem importante na atual produção de filmes de fantasmas são os glitchs visuais; irrupções de pixels e distorções eletrônicas que interrompem a visibilidade total do espectro. Trata-se, novamente, de um erro de interpretação – de dados nesse caso – que gera novos significados para a narrativa fantasmagórica. Este trabalho investiga filmes que apresentam a tecnologia digital como meio para a manifestação do horror sobrenatural. |
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Bibliografia | HANTKE, Steffen. “‘I see dead people’: visualizing ghosts in the american horror film before the arrival of CGI”. In: LEEDER, Murray (Ed.). Cinematic Ghosts: haunting and spectrality from silent cinema to the digital era. London: Bloomsbury, 2015, p.179 - 198. |