ISBN: 978-85-63552-26-6
Título | A Mulher que Inventou o Amor: em busca do sensorial e da ambivalência |
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Autor | Luciano Carneiro de Oliveira Junior |
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Resumo Expandido | Esta comunicação vai se centrar na análise das estratégias de encenação do filme A Mulher que Inventou o Amor (1980, dir. Jean Garrett), com atenção às coreografias e gestualidades dos corpos em cena. O objetivo é lançar um olhar localizado para o gênero das pornochanchadas em sua aproximação a um fluxo do sensacional, atento aos aspectos ambivalentes desse corpus. É em meio à turbulência política dos anos 1970 que uma série de aspectos econômicos e culturais consolida o sucesso das pornochanchadas, gênero de grande aceitação popular que refletia a efervescência da “revolução sexual” então em curso (FREITAS, 2005). Nos setores intelectuais, a pornochanchada seria taxada como “politicamente ‘de direita’, por sua inconstância temática, conservadorismo formal e por desviar as classes populares de questões relevantes e da conscientização de seu papel histórico” (ABREU, 2006, p. 190). Ainda hoje, as pornochanchadas aguardam olhares mais atentos a seus aspectos formais, livres desse tipo de estigmatização e dispostos a abraçar suas complexidades. A exploração da figura feminina no gênero é abordada por Flávia Seligman (2003) a partir do famoso ensaio de 1975 de Laura Mulvey – onde a mulher é identificada como objeto passivo do olhar masculino ativo e dominador. Tal leitura está em acordo com o paradigma ocularcêntrico que se estabeleceu com uma certa hegemonia na teoria do cinema principalmente nos anos 1960 e 1970, onde palavras-chave como voyerismo, fetichismo, exibicionismo e male gaze ocupavam protagonismo (ELSSAESSER; HAGENER, 2010). Não estamos buscando negar essas leituras, mas sim propor novas possibilidades, tomando o corpo e a sensação como instrumentos mediadores para a análise das pornochanchadas, em busca de lugares de fissura e ambivalência. Podemos começar a traçar a nossa contribuição para os estudos em torno da pornochanchada a partir de sua aproximação à noção de fluxo sensacional tão fundamental ao processo de cristalização da modernidade. É no século XIX marcado pelo hiperestímulo que vão se consolidar os processos de industrialização, tecnologia e urbanização, ao mesmo tempo em que é nesse momento histórico que se busca apagar os vestígios da circularidade no campo da cultura. Assim, ao forjar o dualismo razão/emoção e alto mundo/baixo mundo, o projeto moderno burguês estrategicamente recusa os excessos de uma sensibilidade sensacional como recurso de distinção social. Aquilo que é do campo da sensação, desvalorizado frente à contenção exigida de um projeto racionalista, é associado ao “mal gosto popular”, em uma negação do fluxo e da circularidade cultural (BORGES; ENNE, 2007). É partindo dessa noção de sensacional que propomos uma análise de duas sequências de A Mulher que Inventou o Amor, onde buscaremos perceber a partir da mise en scène e das gestualidades o que esses aspectos, de acordo com uma estratégia sensacional-sensorial, estabelecem para além do que está dado no plano narrativo do enredo. É a partir da coreografia dos corpos e de uma aproximação com as matrizes do melodrama e da pornografia – gêneros constitutivos do fluxo sensacional – que, apontaremos, o filme vai estabelecer uma tensão ambivalente no que se refere às questões de gênero e sexualidade. Entendemos o dispositivo da sexualidade também como parte dos agenciamentos de ímpeto ordenador da modernidade, em sua luta da precisão semântica racional contra a ambivalência. A pergunta que nos move é de que forma, a partir de estratégias formais que convidam a um engajamento corporal, A Mulher que Inventou o Amor desestabiliza a dicotomia masculino/feminino. Com essa análise, não pretendemos isolar A Mulher que Inventou o Amor do gênero da pornochanchada; pelo contrário: o objetivo é indicar caminhos para análises mais localizadas de seus exemplares. Apostamos que recuperar o lugar do sensacional na busca por uma análise estética e política das pornochanchadas pode ser produtivo para localizarmos essa produção como campo cultural complexo. |
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Bibliografia | ABREU, N. C. Boca do lixo: cinema e classes populares. Unicamp, 2006 |