ISBN: 978-85-63552-26-6
Título | Eros + Massacre: Presença Corporal do Ator no Retorno ao Passado. |
|
Autor | Felipe Leal Almeida Resende |
|
Resumo Expandido | A alcunha de “anti-representativo”, ou da obra cuja encenação operasse contra o regime de representação, tem funcionado em maiores ou menores graus, e em polimorfas facetas, no mínimo desde o pós-guerra, quando a flexão do cinema em relação à sua própria discursividade narrativa, no que diz respeito ao trabalho do ator, permitiu perverter os laços que sustentavam a performance que não podia ser explicitamente consciente de si mesma, não devia cruzar o espaço encerrado da ação em nenhum gesto suspeito. A condição era a de um veículo, as ordens vinham “de cima”, o papel se desdobrava nos limites do próprio apagamento dos rastros de sua enunciação, e ao corpo e à gestualidade ator, enfim, ficavam relegadas uma posição de carregar momentaneamente o significado de uma espécie de persona, sem interferências na história. Mas a questão que Kiju Yoshida coloca em seu Eros + Massacre (1969) não é tão-somente a de uma burla à representação: como obra que se posiciona na restituição de um passado – os idos políticos que teriam levado ao assassinato do revolucionário Sakae Osugi, sua companheira e líder feminista Itô Noe e uma criança –, como partir de um possível olhar para acontecimento que já-foi, não se contentando em restitui-lo da maneira que “aconteceu”, mas fazendo cruzar temporalidades distintas, interpelando a organicidade com reequenadramentos sucessivos que desfamiliarizam o lar, a cidade, a unidade familiar nuclear, a planificação à altura do tatame – todos pontos neurais da cinematografia e cultura japonesas – e como atingir tal grau de indiferenciação temporal sobretudo pelo corpo todo do ator? Considerando-se que à grafia dos movimentos resta “uma expressão abstrata, não sendo o talento dramatúrgico do ator, mas sim uma presença, uma força física carregada pelo seu próprio corpo” (YOSHIDA, 2013) aquilo que produz um devir-sentido ao acontecimento histórico, a materialização desse estado não seria antes uma zona de indiscernibilidade que se produz entre o tempo neutralizado – para lançar perguntas, não oferecer respostas – e o corpo enquanto simultaneamente sujeito e objeto, “subjétil” (FERRACINI, 2013)? Aqui, parece que só nessa dupla condição de ordem histórico-física, de passado e de força presente, feita no gesto único dessa presença, que se pode montar uma encenação que dê conta dos fios múltiplos do passado. Partiremos de possibilidades outras de conceber o tempo em seus cruzamentos (DELEUZE, 1992; 1999), para além de sua cronologia sucessiva, buscando, nessa extensão que interconecta passado-acontecimento, presente-questão e futuro, a conjugação dessas temporalidades num corpo que se torna presente e imanta a câmera, gesticula sua unicidade e co-dirige, reenquadrando por consequência a posição do realizador enquanto aquele que refaz a história e desfaz as certezas. Nessa figura que "não é inteiramente ela mesma" (GROTOWSKI, 2011), no corpo que experimenta a borda do significado, que transita entre a presentificação e a ausência do conector representativo, qual a busca, qual a nova expressão que se cria? E quais os rebatimentos para a estrutura de abordagem do cinema diante da história? |
|
Bibliografia | Deleuze, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil-Platôs: capitalismo e esquizofrenia. Vol. 4. Rio de Janeiro, Ed. 34, 1997. |