ISBN: 978-85-63552-26-6
Título | O Fora de Campo como Dobra da Mise-en-Scène nos filmes de André Novais |
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Autor | felipe maciel xavier diniz |
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Resumo Expandido | Alguns filmes recentes brasileiros apresentam uma experiência que articula o drama com algo que vem de fora, compreendido aqui como um dado gesto de inspiração documental. Algo que em alguma instância faz enredar aquilo que entendemos como o vivido com as dimensões fabulares. Imagens marcadas por uma indiscernibilidade entre o que é próprio da mise-en-scène e as forças que vêm de fora. Ao olhar para esses filmes, nosso intuito é problematizar os desenquadramentos de um cinema cuja encenação é afetada por uma força compreendida como dobra do fora de campo. A dobra é um conceito estabelecido por Leibniz, filósofo alemão morto na primeira metade do século XVIII, que traduz um pensamento que incide sobre as inclinações que movem a alma, como que operadas sob um prolongamento de singularidades constituintes dos sujeitos – uma dobra entre a alma e a matéria, o cerne de um múltiplo e ao mesmo tempo o princípio de um indiscernível. Deleuze (2012) atualiza esse conceito no livro A Dobra: Leibniz e o Barroco, no qual o autor francês discute o barroco como uma função operatória, um traço: “O traço do barroco é a dobra que vai ao infinito” (DELEUZE, 2012, p. 13), um labirinto cuja gênese mostra-se múltipla. E o múltiplo, segundo Deleuze (2012), não é aquele que possui muitas partes, mas muitas dobras. Pensar nos termos da dobra é também apostar na indissociabilidade entre o dentro e o fora, desmontar a ideia de que a eles são projetados dois espaços distintos. Não há um fora, um todo, porção objetiva, modelo para transformação da parte compreendida como dentro. Nosso intuito é justamente refletir sobre a relação da mise-en-scène (que não necessariamente é prisioneira de um dentro, como espaço homogêneo) com o fora de campo (entendido para além de um espaço/tempo descolado da cena). A partir do recorte da obra do diretor mineiro André Novais, acreditamos que o Novíssimo Cinema Brasileiro se presta perfeitamente a esta discussão. Essa ideia se desenvolve quando percebemos, nos filmes de Novais, a duração na experiência dos tempos mortos (que são também produções), no reflexo de um personagem que recusa a ação mimética, na expressão de uma imagem que, mesmo enquadrada, é desterritorializada na experiência de uma tentativa de fuga constante das representações. Assim, percebemos uma aproximação da vida ordinária com procedimentos que reforçam sua dramaticidade e que também modulam a cena. Nessa direção, percebemos um real não como referente, mas como produção. Se o real é o todo, o infinito fora de campo, inscrito nas formalizações (BADIOU, 2017), como referente ele é, ao mesmo tempo, construto. Neste sentido somos mais Metz (2006) do que Bazin (1991). Nossa leitura é mais ligada ao real como aparência de um acontecimento do que como um objeto a ser buscado. Não um realismo ontológico, mas uma dobra. Um risco. Um impasse, aquele que é constantemente adiado, mas que acontece. Na compreensão de um viés documental não atrelado a uma forma de verdade, mas mobilizadora de instâncias fabulatórias, chegamos à proposição de um efeito de real, tal como entendido por Bathes (1972). Encontramos, nos filmes de Novais ligados a uma estética recorrente no Novíssimo, uma imagem tomada por detalhes insignificantes, em que a percepção se faz por excesso. A presença dessas minúcias supérfluas, que tomam de assalto a cena por um determinado dispositivo e por uma estratégia de mise-en-scène (acima expostos), não é compatível com as representações mais deterministas. Há um excesso, uma sobra, traduzida em um ambiente hiper-real, que produz mais nebulosidades que certezas. |
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Bibliografia | AUMONT, Jacques. O cinema e a encenação. Lisboa: Texto & Grafia, 2008 |