ISBN: 978-85-63552-26-6
Título | Montagem e estratégias políticas do cinema brasileiro entre 68 e 70 |
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Autor | Anita Leandro |
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Resumo Expandido | Realizados num período de recrudescimento das lutas sociais e da repressão, "Manhã cinzenta" e "Você também pode dar um presunto legal" são filmes emblemáticos da resistência do cinema brasileiro à ditadura. Por causa de seu filme, Olney São Paulo pagou, como se sabe, com a própria vida. E o filme Sérgio Muniz, rodado clandestinamente, sequer pôde ser projetado, sob pena de colocar em risco a vida dos membros da equipe. Garrafas lançadas ao mar, rumo a um futuro incerto (2018?), essas obras, que hoje deveriam fazer parte do programa escolar obrigatório, seguem à margem da história, evocadas de vez em quando em trabalhos universitários, mostras e festivais. Propomos, aqui, um estudo das estratégias de montagem nesses dois filmes, com o intuito de compreender suas respectivas leituras do momento histórico de suas realizações. Para além de uma aproximação estética das duas obras, buscaremos, em seus procedimentos de montagem, informações sobre o engajamento político de cada uma delas, às vésperas do AI-5 e sob sua vigência. A partir de um roteiro de 1966, Olney São Paulo filma em 1968, nas ruas do Rio, ainda com margem de manobra para driblar a censura e integrar à sua ficção as manifestações em curso. O mesmo já não acontece com o filme de Sérgio Muniz, rodado a partir de 1970, às escondidas, sob a mira do AI-5, da pena de morte e do delegado Fleury, encarregado do extermínio das esquerdas. Entre documentário e ficção, os filmes constroem narrativas complexas desse passado recente e colocam para o presente, uma pergunta incômoda: 1968, no Brasil, realmente, terminou? Difícil saber, como tampouco se sabe, de fato, quando começa o 68 brasileiro. Em 1964? Talvez. Uma historiografia atenta às raízes do aparato repressivo e de sua ligação com a luta de classes precisaria retornar à primeira metade do século XX, quando se esboça a imagem do “inimigo interno”, com a criação da DEOPS, em 1924, transformada em DOPS, em 1945. O cinema brasileiro de 1968-70 traz as marcas de uma longa história de repressão, inscritas no próprio corte de alguns filmes. Suspeito de participação no primeiro sequestro de avião pela guerrilha, em 8 de outubro de 1969, o cineasta Olney São Paulo é preso poucos dias depois. Desviado da rota Belém-Manaus, o avião segue para Havana, com 43 passageiros, três tripulantes e uma cópia de "Manhã cinzenta", adquirida um dia antes por um dos sequestradores, Elmar Soares de Oliveira, membro da Federação de Cineclubes. Mantido incomunicável por doze dias, o cineasta é interrogado pelos ministérios da Aeronáutica e da Justiça e declara desconhecer as intenções do cineclubista. Olney sai da prisão com pneumonia dupla e morre em 1978, aos 41 anos de idade, com câncer no pulmão. Apesar da censura, "Manhã cinzenta" reúne cenas de ficção, imagens documentais da televisão e performances de atores em meio a verdadeiras manifestações de rua, filmadas por José Carlos Avellar, estratos da tempo sedimentados na montagem, que buscaremos analisar. Você pode dar um presunto legal começa onde o filme de Olney termina, ou seja, com a morte. Primeiro filme sobre os esquadrões da morte e um de seus chefes, o delegado Sérgio Paranhos Fleury, "Presunto" é feito num momento de grande perigo e encontra na encenação de verdadeiros depoimentos e em citações de trechos de peças teatrais a possibilidade de falar dos crimes do Estado. Mesmo na clandestinidade, a produção consegue inserir na montagem uma imagem inédita, da condecoração do torturador Sérgio Fleury pela Marinha. Quando "Presunto" foi, finalmente, lançado em 2006, o documentarista Luiz Alberto Sanz previu que o filme iria enfrentar dois graves problemas: “a desinformação sobre o caráter essencial da repressão (...), bem como o fato de que a pequena burguesia, hoje como ontem, em lugar de rejeitar os esquadrões da morte, considera-os um mal necessário” (SANZ, 2007). Em 2018, a premonição de Sanz se confirma, sob o silêncio geral imposto pelas milícias à sociedade e ao cinema. |
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Bibliografia | AGAMBEN, G. Karman. Court traité sur l’action, la faute et le geste. Seuil, 2018. |