ISBN: 978-85-63552-26-6
Título | O gesto dos mortos: a imagem-zombie e o cinema mainstream dos anos 90. |
|
Autor | Diego Paleólogo Assunção |
|
Resumo Expandido | O cinema, a imagem em movimento, guarda a capacidade de repetir continuamente – a mesma imagem, o mesmo gesto, o mesmo olhar. Essa proposta é mais uma experiência plástica e menos um desejo acadêmico de escrita. A partir do texto, convocar imagens, stills de filmes que se interpelam a fala. Gostaria de falar de um outro tempo – uma temporalidade abjeta, talvez, uma cronologia não-normativa dos mortos a partir de um cinema. Peter Szendy em Cinema-Apocalypse, convoca para o Apocalipse a noção-conceito de revelação, herdeira das tradições judaico-cristãs, e ilumina que, para algo ser revelado, deveria ‘ter estado ali’ o tempo todo. Nesse sentido, no jogo entre o visto e o não visto, nas fissuras do dispositivo, no dito e não dito, nas tramas entre o sexo e a morte (Bataille, Almodóvar), Apocalipse é uma estratégia entre o visível e o invisível – fazer ver, revelar, expor; os mortos levantarão e andarão sobre a Terra. Mas que mortos, que corpos e subjetividades mortas são essas? Um corpo, uma imagem, um espectro – o resíduo, resto de uma existência qualquer que guarda de semelhança com o que existiu apenas vestígios. Tanto Szendy quanto Laura Mulvey, ao investigarem a relação da imagem em movimento com a morte, operam as tensões maquínicas do cinema, da câmera, da pele fílmica: a emergência de novas tecnologias digitais que marcam o início de um novo milênio e os fins do anterior. De repente, antes de morrermos na virada para o ano 2000, antes mesmo do ‘bug do milênio’, nos tornamos ciborgues. O que pode uma morte? Re-animadas, as imagens vivem, os mortos retornam, o tempo se desfaz, volta, para. Agamben e Spivak em relação sobre as potências do não e as políticas da subalternidade – a monstruosidade, nas imagens, reage e grunhi: a alteridade, a partir das relações hegemônicas de poder, não pode falar, só grunhir, rastejar, se esconder, morrer time after time. O cinema, a imagem que ganha vida – monstros manufaturados, vampires, zombies - , é fantasia intermediária entre o nosso possível, a nossa sensibilidade, e uma morte-por-vir. Enquanto espectral e fantasmagórica imagem em movimento – Tom Gunning, Walter Benjamin – o cinema é uma imagem morta reanimada, que volta à vida através da ilusão de movimento. Se a fotografia permanece, em seus registros mais clássicos, como algo estanque, imobilizada dentro de seus suportes – placa de metal, vidro, papel, telas – a imagem do cinema percorre sobre a imensa tela branca (para Susan Buck-Morss, “a tela do cinema como prótese da percepção”). O cinema também colapsa. Sigo alguns fios, pontos luminosos que aparecem, emergem, sobrevivem (Didi-Huberman, Mondzain). Hollywood é obcecada pela Morte/pelos Mortos. A relação dialética engendrada entre o binômio Morte e Vida se dá exatamente no interstício desses dois campos visuais: a imagem como algo morto-vivo. Os anos noventa, a última década do século XX, através do cinema mainstream, olhou para a morte com um olhar quase encantado. A sensibilidade de uma morte-em-vida (ética, política, estética) fez-se presente no imaginário ocidental. Através do ridículo, do grotesco, do inusitado, do apocalipse ou apenas através de uma “forma de habitar o mundo” – diversos outros mortos tomaram as imagens: Ghost, do outro lado da vida (Jerry Zucker, 1990), A Morte Lhe Cai Bem (Robert Zemeckis, 1992), A Família Addams II (Barry Sonnenfeld, 1993), O Estranho Mundo de Jack (Henry Selick, 1993), Jurassic Park (Steven Spielberg, 1993), A Bruxa de Blair (Eduardo Sanchez, Daniel Myrick, 1999), O Sexto Sentido (M. Night Shyamalan, 1999), Matrix (Lana e Lilly Wachowski, 1999). Estamos todos mortos? Baudrillard convoca um ex_termínio, um pós-término. Zizek, em uma contramão enviesada, nos inscreve enquanto vampiros e zumbis vegetando no simbólico. Então, talvez, a proposta esteja mais vinculada ao político – tornar visível em um sentido mais radical: destruir, romper o encanto, o feitiço capitalista das imagens e perceber esses artefatos enquanto mediações. |
|
Bibliografia | BAUDRILLARD, Jean. A ilusão vital. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. |