ISBN: 978-85-63552-26-6
Título | O relato pessoal no documentário em primeira pessoa |
|
Autor | Raquel Valadares de Campos |
|
Resumo Expandido | Como filmar o vazio? Como tornar presente o que está ausente na imagem? Diante da impossibilidade da representação do trauma e da catástrofe, o que fazer? Ou, como disse Lúcia Murat em ambos prólogo e epílogo de seu documentário em primeira pessoa, Uma Longa Viagem (2012): “O que fazer diante da morte se não chorar ininterruptamente?”. Um filme? A meu ver, a chave capaz de ressignificar a imagem presente e presentificar o passado, advinda sobretudo da teoria literária, é a narrativa testemunhal, baseada no relato de um eu que estava lá, viu, viveu e sobreviveu para contar (RICOEUR). Interessa-me, sobretudo, o cinema documentário em primeira pessoa realizado por testemunhas superstes, ou seja, realizado por sobreviventes. Cineastas como, dentre outros, Lúcia Murat, Rithy Panh e Patricio Guzmán, cujos filmes tentam comunicar a sua própria experiência traumática – da tortura, da prisão, do trabalho forçado, do exílio e da perseguição política – inscrevendo, assim, as marcas da violência de Estado (SELIGMANN-SILVA) em contra-narrativas engajadas politicamente e alinhadas à história dos vencidos (BENJAMIN). Pretendo trazer ao painel um recorrente recurso de linguagem desse cinema documental em primeira pessoa, as cenas em que o realizador sobrepõe ao restos e vestígios contidos na imagem do presente, a camada discursiva do seu relato pessoal, apontando para o que certa vez existiu ali – ou seja, operando na chave da referencialidade (NICHANIAN) e não da representação do real, em que o testemunho serve de índice do invisível da imagem e do inexprimível do acontecimento. A proposta é refletir sobre a potência desse recurso cinematográfico no que consiste em “olhar as coisas de um ponto de vista arqueológico”, ou seja, em “comparar o que vemos no presente, o que sobreviveu, com o que sabemos ter desaparecido” (DIDI-HUBERMAN) a partir da lógica discursiva da primeira pessoa, quando ela relata a si mesma (BUTLER) a partir da sua memória narradora (CAVARERO). Para além do pacto de credibilidade (PIEDRAS), o que está em jogo é a criação de uma presença e de um espaço de escuta, necessariamente dialógico, com o espectador, que pode então imaginar o que lá tenha ocorrido. |
|
Bibliografia | BENJAMIN, Walter. Magia e tecnica, arte e politica: ensaios sobre literatura e historia da cultura. Brasiliense, Sao Paulo, 2012. |