ISBN: 978-85-63552-26-6
Título | Phoenix (2014) e o percurso melodramático de Christian Petzold |
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Autor | David Ken Gomes Terao |
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Resumo Expandido | Realizando o que Jaimey Fisher (2013) chama de "arqueologia fantasmagórica dos gêneros", Petzold revisitou o melodrama em algumas obras de sua filmografia, dando a cada um desses filmes uma leitura diferente do gênero. Em Wolfsburg (2003) a narrativa moral em meio ao conflito de classes se reconfigurava pelas questões econômicas contemporâneas. Já em Fantasmas (2005) o melodrama surgia em meio a ruínas do que eram as relações afetivas e familiares no melodrama clássico e lugares marcados pela inscrição do passado da Alemanha na paisagem do presente, configurando um filme ainda mais marcado pela rarefação e pela ausência de um maior conhecimento dos personagens por parte do espectador. Após o drama histórico empreendido em Barbara (2012), Petzold retomou um olhar para o passado da Alemanha em Phoenix (2014), onde desenvolve uma narrativa situada em 1945 na Berlim do pós-Guerra. A história conta a história de Nelly, uma mulher judia sobrevivente do holocausto que, após um resgate dos campos de concentração e uma cirurgia de reconstrução facial sai em busca do marido Johnny que, embora não a reconheça, percebe nela uma semelhança com sua mulher que crê estar morta e propõe que ela se passe por ela para que ambos tenham acesso ao seu dinheiro. Apresentada em uma mise-en-scène que remete à era clássica do gênero, essa narrativa no entanto cai rapidamente no absurdo, pedindo do espectador um olhar outro que o da identificação que o naturalismo geralmente visa agenciar. Em vez de desenvolver uma narrativa pautada na verossimilhança dos fatos, o filme desenvolve um jogo de atuação entre os personagens que se dá pela chave do Reenactment dos fatos históricos, criando um comentário ao próprio processo da encenação e aos elementos que criam a crença no espectador. Tal narrativa atravessa referências diversas no cinema, as quais tem a ver tanto com o recorte histórico em que ela se dá quanto com as estéticas cinematográficas que a antecederam. O holocaust film, que se dá sempre na chave do melodrama é reconfigurado aqui com certo distanciamento que evita a espetacularização dos eventos e comenta de que maneira os relacionamentos privados reproduziam a esfera de poder do regime nazista. Phoenix também revisita diversos códigos do expressionismo alemão que, como observa Sigmund Kracauer, (2004) manifestou o mal-estar político que antecipou o nazismo na Alemanha. Da mesma maneira, expressando através de sua estética o estado das coisas político, o cinema de Fassbinder, sobretudo em O Casamento de Maria Braun (1979) proveu uma base para a narrativa de uma mulher que busca reconstruir a sua vida após a guerra, bem como a proposta de uma reconfiguração das convenções melodramáticas. Por fim, é possível observar que essa exposição do processo de encenação encontra semelhança em Um Corpo Que Cai (1958), onde ambos os personagens masculinos se colocam como encenadores e "criam" mulheres à sua medida. No entanto, em Phoenix essa relação é questionada, uma vez que o protagonismo é da mulher colocada como algo a ser encenado e o ato de encenar é colocado ele mesmo em questionamento. Phoenix se aproxima bem mais do cinema clássico do que as obras anteriores de Petzold de modo que sua forma e narrativa comentam a composição das tramas melodramáticas e o processo pelo qual o pathos melodramático conduz o espectador à crença, mesmo diante de algo totalmente alheio ao realismo. Assim, Phoenix à sua maneira "O que é um melodrama?". Petzold se inserindo na linhagem de cineastas que optaram pela auto-consciência formal como Sirk e Fassbinder e desenvolvendo uma discussão de como as formas clássicas sobreviveram e foram repensadas na contemporaneidade. |
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Bibliografia | ELSAESSER, Thomas. Tales of Sound and Fury: Observations on the Family Melodrama. In Imitations of Life: a reader on film and television melodrama. Wayne State University Press, 1991 |