ISBN: 978-85-63552-26-6
Título | A morte em Titicut Follies: O nada como ferramenta dialética |
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Autor | Bruno Alves Ferreira |
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Resumo Expandido | Este artigo tenta compreender de que forma Frederick Wiseman, diante dos imensos desafios oferecidos pela imagem da morte e seus afetos primordiais, tenta encontrar como solução formal a montagem dialética para acessar o afeto original deste tipo de imagem. A representação da imagem real da morte possui desafios elementares. Por um lado, a morte quando figurada no documentário suga quem assiste para crer, irrefutavelmente, que há um princípio de realidade a mostra. Por outro lado, a sua exibição é atravessada por tabus de ordem social e filosófica, retirando dela qualquer forma de neutralidade. A sua exibição é por natureza ética, portanto uma imagem que retorna o olhar, e também é existencial por lidar com as certeza absoluta e angustiante de todo ser, o seu fim derradeiro. Uma imagem por natureza auto-reflexiva. Identifica Vivian Sobchack um imenso desafio ontológico na imagem de morte documental. Que a sua realidade demonstrada aponta sempre para um outro lugar que não cabe ao visível da imagem. É a tentativa de transmissão de uma experiência inominável através do nomeável, o codificável, ou, mais adequadamente: a tentativa de representar algo que não cabe ao campo da representação. É uma experiência que se surge através da representação, parece de alguma maneira invalidá-la como passível de comportá-la. Diante deste tipo de desafio, alguns documentaristas buscam por estratégias representacionais para remetê-las a este outro espaço que cabe a imagem da morte. Em Titicut Follies (1967), Frederick Wiseman se utiliza da montagem dialética para se aprofundar neste local proibido ao domínio do representacional. Em seu documentário, sobre o cotidiano de um hospício para criminosos, um paciente em greve de fome tem sua imagem continuamente contraposta a imagem de um cadáver sendo embalsamado. Um trabalho de montagem dialética que operava no simbólico, na disposição contínua entre a resistência da vida e a desistência da morte, é transformado quando finalmente se reconhece que ambos os sujeitos são a mesma pessoa. Antes vivo, agora morto. E nesta descoberta, surgida no hiato deste choque, é que irrompe uma experiência que foge ao representacional. Tenta-se descobrir o que acontece na experiência desta imagem utilizando como alicerce o método fenomenológico e o trabalho de Vivian Sobchack e Martin Heidegger. Se identifica, através das observações de Didi-Huberman e Leo Charney, que certas imagens tem como natureza a capacidade de criar um espaço de abstração que retira a hegemonia do sentido daquela experiência. A imagem da morte por natureza possuirá esta particularidade. Por apontar a um lugar outro que não está contido na imagem, ela é também operadora de uma abertura em seu âmago para um espaço nulo no qual o sujeito deve se projetar. Simbolicamente, o conceitual da morte é identificado por Martin Heidegger como um vazio no horizonte do ser, um lugar de inoperabilidade e inexistência. Em conjunto, a imagem da morte se torna uma presença que despresentifica. Uma imagem capaz de gerar uma experiência estética de ausência total, que desloca a experiência do campo analítico da compreensão tradicional para o campo afetivo. Reconhece-se que Wiseman, diante das dificuldades inerentes de se representar, ou experienciar o nada contido no âmago deste tipo de imagem, essencialmente tenta gerá-lo a partir também de seu equivalente formal. A partir do choque dialético não só Wiseman ressignifica a imagem original como, retirando a imagem do morrer do sujeito em câmera, também permite a representação, uma mediação, um ponto de acesso que transporta a experiência a um novo paradigma de experiência. Palavras-chave: Morte; Fenomenologia; Experiência; |
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Bibliografia | ARIÈS, Philippe. O Homem Diante da Morte. São Paulo: Editora UNESP, 2014. |