ISBN: 978-85-63552-26-6
Título | A MONTAGEM EM SIMULTANEIDADE E EM MULTICAMADAS NO CINEMA CONTEMPORÂNEO |
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Autor | Maria Dora Genis Mourão |
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Resumo Expandido | Quando Orson Welles realiza "Cidadão Kane" (1940) e, logo a seguir, surgem os filmes do Neo-Realismo Italiano no período do Pós-Guerra, já se elaborava importante alteração na tradição narrativa e de representação Griffthiana em favor de um percurso que, pode-se dizer, vai do naturalismo ao realismo. Em Orson Welles, temos a impenetrabilidade das personagens, o relativismo do olhar, a ideia de que tudo depende de um ponto de vista do olhar que pode ser diferente, parcial e relativo (ao invés da visão única do modelo Griffith), a mistura de estilos diferentes (do jornalístico-documental ao expressionismo), a noção de fragmentação (o filme constituído por blocos narrativos e sequências independentes), a preocupação em registrar o tempo interior da ação em sua integridade (plano-sequência), o desenrolar de duas ações diferentes no mesmo plano (profundidade de campo), a narrativa em espiral fechando-se num círculo em oposição à linearidade teleológica de causa-efeito. Godard, um dos representantes mais importantes da Nouvelle Vague francesa, desenvolve diversas possibilidades de linguagem já antevistas em Orson Welles: fragmentação (que depois se revelaria como a procura de uma nova unidade), relativismo e parcialidade no olhar, rompimento com a teleologia, fenomenologia, simultaneidade, a noção de que a realidade é feita por camadas. Todos conceitos que vão se opor diretamente ao modelo narrativo Griffthiano. Nesta oposição redescobrem Eisenstein e Vertov. Godard é, em muitos aspectos, uma síntese de Eisenstein (na montagem de ícones modernos) e Vertov (na maneira de olhar ). Com as novas tecnologias ampliam-se os recursos que permitem desenvolver novas formas de realismo ou, se quisermos, de realidades. Peter Greenaway é um dos que tem procurado estabelecer , por exemplo, a narrativa em simultaneidade e em multicamadas. A leitura/visão de um filme não se processa apenas na horizontalidade, mas também na profundidade e verticalidade (Eisenstein/Orson Welles). Dessa maneira, a narrativa se desenvolve em uma nova dimensão temporal e espacial onde os conceitos de montagem simultânea e em multicamadas adquirem importância fundamental. Cada realidade a ser mostrada é composta por múltiplas camadas, temos a fusão/síntese de várias ações acontecendo simultaneamente. Num mesmo momento, sobrepostos, vemos planos gerais e detalhes de uma mesma cena, janelas que se abrem para comentar a cena ou introduzir uma outra. Embaralhamento de acontecimentos que transcorrem ao mesmo tempo, aproximando-se cada vez mais do processo que nossa mente desenvolve para registrar os acontecimentos. Nossa mente é capaz de registrar simultaneamente milhares de imagens e sons, sendo que tendemos a priorizar aquilo que nosso foco de atenção determina. Cada vez mais as novas técnicas permitem que o cinema proceda de maneira semelhante, chegando ao que Eisenstein desejava: "o cinema deve ser a materialização do pensamento em movimento." Eisenstein tentará desenvolver um projeto no qual os conceitos de montagem simultânea e em multicamadas seriam utilizados de maneira ousada e radical. Trata-se do projeto não realizado A Casa de Vidro (The Glass House), que começou a ser pensado em 1926 quando em uma viagem a Berlim observa o uso excessivo de vidro nas novas propostas arquitetônicas. Esse projeto nos permitirá verificar sua intuição, e quase que premonição, no que diz respeito à necessidade de um aparato técnico mais avançado que possibilite ”buscar novos pontos de vista, novos enquadramentos, novas interpretações”. O avanço tecnológico, principalmente no tocante à digitalização de imagens e ao surgimento de vários softwares de efeitos e da montagem digital, estão dando uma resposta a seus anseios. É este projeto que propomos analisar tomando como exemplo, também, o filme Dogville (2003) de Lars Von Trier. Nesse filme as casas não são de vidro, elas simplesmente não tem paredes, portanto a transparência é total. |
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Bibliografia | ALBERA, François. Eisenstein e o construtivismo russo. São Paulo, Cosac Naify, 2002 |