ISBN: 978-65-86495-01-0
Título | Como mensurar a "escrita de si" no documentário? |
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Autor | Laécio Ricardo de Aquino Rodrigues |
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Resumo Expandido | Como indicam Michael Renov (2004) e Laura Rascaroli (2009), dentre outros autores, desde os anos de 1970, desponta no documentário uma vertente marcada pelo triunfo da enunciação em 1a pessoa, enunciação esta conduzida/articulada majoritariamente pelo diretor, cuja presença física (voz e/ou corporalidade) também se intensifica e se afirma na tomada. Nesta tradição, pois, o documentarista não é mais um mediador, não se restringe aos bastidores, tampouco se limita à assinatura de abertura ou desfecho dos créditos. Ele é alguém que deixa o antecampo, ocupa a cena e partilha conosco algumas de suas aflições/inquietações pessoais, num transbordamento subjetivo por vezes surpreendente. Fato notável se ponderarmos que o documentário, historicamente, não se codificara enquanto obra demasiadamente autoreferenciada. Ou seja, em geral, não fazemos um documentário sozinho, tampouco apartado da pulsação cotidiana e das urgências dos nossos dias – sem conexão com nossos pares, com os grupos sociais com os quais interagimos e os dilemas por eles enfrentados. Paixão pela alteridade, redescoberta de si no outro e vice-versa, revisão de nossas convicções – eis uma definição possível para esta atividade e seus engajamentos, embora não desprovida de limitações. Mas eis que a prática contemporânea do documentário nos revela esta espécie de "primazia do eu" em alguns títulos, operação na qual a presença cênica do diretor, ora performática, ora confessional, reforça uma individualidade e autoria, outrora limitada à gestão do processo criativo e à interação com os sujeitos no mundo. Espécie de autor-personagem, nestas obras o cineasta se entrega a um relato de si e do seu entorno próximo marcado pela explicitação do íntimo, por vezes com tonalidades autobiográficas. Feita tais observações, chegamos ao ponto central do debate que desejamos cotejar e aprofundar. Embora seja um fenômeno bem discernido na obra de alguns autores, notamos que ainda são pouco precisas as ferramentas conceituais de abordagem e entendimento desta prática fílmica. Afinal, o que está em jogo nesta operação na qual um relato íntimo (do diretor) se adensa e questões outrora privadas são publicizadas? Seria um esforço de construção e elaboração autobiográfica? Se o for, quais as características deste exercício - a autobiografia? Ou seria, uma construção mais próxima da autoficção, conceito apregoado por certa teoria literária francesa (Noronha, 2014) e talvez evidente em alguns destes filmes? Ou seria o auto-retrato, na apreciação que Bellour (2000) e Rascaroli (2009) fazem deste conceito, a categoria que melhor expressa o que está em jogo nesta "escrita de si" no documentário? Nesta apresentação, desejamos mensurar tais conceitos, avaliando suas possibilidades e valor heurístico para ponderarmos o que está em operação nos filmes marcados pelo triunfo da enunciação em primeira pessoa. Uma proposta que se pretende introdutória, diga-se de passagem, tendo em vista a complexidade destas categorias e o viés inicial do estudo. |
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Bibliografia | BELLOUR, Raymond. Auto-retratos. In: Entre-imagens. Campinas: Papirus, 2000. |