ISBN: 978-65-86495-01-0
Título | Produção de presença e cinema, em Central, Rifle e Cidades fantasmas. |
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Autor | Guilherme de Souza Castro |
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Resumo Expandido | Narrativas são modos de contar histórias que levam o público/leitor/espectador a acompanhar a apresentação, compreendendo a trama, o que pode ser dito produção de sentido, e, na mesma experiência de leitura/assistência, vivenciando estados emocionais relacionados mais à descrição do que aos acontecimentos em si, o que pode ser compreendido como produção de presença, conforme leitura que faço de Hans Ulrich Gumbrecht (2010). Para a experiência de proximidade e o sentir-se tocado, em um componente de materialidade necessário à produção de presença, convergem o ponto de vista e a voz narrativa, ou seja, o posicionamento da onde se observa e a perspectiva com que se dá a conhecer os fatos da intriga (Ricoeur, 1994). Em cinema, a produção de presença é reforçada porque há um olhar privilegiado, que se aproxima, passeia e observa a cena, sempre a partir de pontos de vista que pressupõem, incluem e posicionam o sujeito que assiste (Xavier, 2003). Conforme a construção narrativa, o espectador se engaja, é agente e objeto, uma vez que toma parte “dos posicionamentos e efeitos espaciais/temporais do contar” (Browne, 2005, p. 249). Assim, são possibilitados os liames que cada um a seu modo estabelece entre si mesmo e os filmes, o que pode se traduzir por ‘estar sujeito à experiência estética’, ou seja, a “certas sensações de intensidade que não encontramos nos mundos históricos e culturalmente específicos do cotidiano em que vivemos” (Gumbrecht, 2010, p. 128). Para este estudo, são analisados três filmes brasileiros realizados no Rio Grande do Sul: Central (documentário, dirigido por Tati Sager, 2017), Rifle (ficção, dirigido por Davi Pretto, 2017) e Cidades fantasmas (documentário, dirigido por Tyrell Spencer, 2017). Em Central, a potência cinematográfica está no modo presente e vivo em que se transforma o discurso de conteúdo, pois, mais do que compreendido, o drama carcerário é sentido pelo espectador como percepções a partir de olhares internos ao presídio de Porto Alegre. Neste filme, a ambiência insalubre e violenta é carregada pela articulação das perspectivas a partir de lados opostos da linha divisória entre os espaços controlados pelas organizações criminosas e pela força policial do Estado, ou seja, entre as imagens realizadas com capricho e técnica pela equipe e o olhar dos próprios presos, nas imagens feitas por eles mesmos, de modo cru e direto. Rifle constrói a vastidão horizontal e o silêncio ventoso dos campos do Sul através do ponto de vista um jovem que trabalha e vive com uma família empobrecida, disposta a vender a pequena posse e seguir para a cidade. O avanço dos plantadores de soja, o movimento de gente, máquinas, automóveis e caminhões que surgem perturbam o personagem ao ponto de uma espécie de surto violento em reação às transformações ameaçadoras. O olhar da câmera identificado à psicologia e à urgência do protagonista confere à narrativa incompletudes e incertezas, o que convoca a participação do espectador, ao mesmo tempo em que o sentimento de perda do lugar de origem é compartilhado em efeitos de Stimmung. Em Cidades fantasmas, a condução da narrativa é pelas memórias de sobreviventes, registradas em visitas às ruínas de antigos lares atingidos por diferentes tragédias. Além das fotos de época das cidades ainda com vida, as imagens do filme, cujos movimentos em passeios lentos e longos, quadros em composições bem equilibradas e luzes naturais enfatizam a beleza das ruínas visitadas e lembradas com afetos. No filme, os efeitos de produção de presença são reforçados quando é trazido ao presente a percepção de um doloroso tempo passado. Central, Rifle e Cidades fantasmas apresentam estratégias narrativas audiovisuais que posicionam o olhar do espectador no interior das cenas, o que promove a identificação com personagens, situações e ambientes (Browne, 2005), como fator que favorece a produção de presença e a intensidade das experiências estéticas no modo de construção dos filmes. |
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Bibliografia | BROWNE. Nick. O espectador no texto: a retórica de No tempo das diligências. In: Pessoa Ramos, Fernão (Org.). Teoria contemporânea do cinema. São Paulo: Senac, 2004. |