ISBN: 978-65-86495-01-0
Título | La Parole Vivant – A declamação no cinema de Eugène Green |
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Autor | Rogerio Eduardo Moreira Pereira |
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Resumo Expandido | Com fortes influências religiosas e sérias criticas à modernidade, Eugène Green explora a declamação em sua obra, acreditando encontrar ali respostas mais eficientes em sua busca pela representação do que ele denomina a palavra encarnada, com o propósito de trazer ao público contemporâneo uma linguagem que segundo ele é a única capaz de criar um elo do mundano com o divino. Para ele “na declamação, a fala não é mais uma idéia abstrata e irrelevante, como pode ser visto em sua forma escrita: o enunciado declamado, e sua sacralidade, existem através da encarnação da palavra no corpo e no sopro de um homem” (2001:25). A obra de Green tem como principal característica estética uma atuação em aberta recusa ao naturalismo, onde o apuro na entonação do texto e o minimalismo da expressividade produzem para ele uma interiorização dos diálogos, como se cada personagem, ao falar com o outro, falasse antes consigo mesmo, formalizando assim a instância declamatória. Em entrevista, ele relata sua poética: Quando eu filmo uma pessoa, é a energia interior que me interessa. Quando um ator faz uma interpretação psicológica, é sempre falso. O ator está constantemente pensando: o que devo fazer para expressar esta situação, ou essa emoção. Não há nada real. Uma interpretação psicológica é sempre intelectual. (Film Quaterly vol 68 n 04) Para entendermos essa conformidade entre a declamação “encarnadora” da palavra e esta atuação distanciada da dramatização e da psicologização Stanislavskiana, recorreremos indubitavelmente à antítese proposta por Brecht, que definia o distanciamento como método de “retirar do acontecimento ou do caráter aquilo que parece óbvio, o conhecido, o natural, e lançar sobre eles o espanto e a curiosidade”. (Brecht apud Bornheim, 1992:243). Assim como na retórica clássica, escola formativa da declamação, o dialogo provocativo com o espectador era um fundamento basilar do teatro épico proposto por Brecht, uma forma de discursar com prerrogativas diretas de interlocução crítica através da recepção da audiência, indo de encontro aos então estabelecidos referenciais de ação, espaço e linearidade temporal do drama, fundamentadas na Poética de Aristóteles. Pretendemos demonstrar que do histriônico ao naturalista, a declamação sempre teve como matriz a apresentação, o emprego da palavra em sua forma oral em suas diversas aplicações e intenções, tanto no contexto de um fórum quanto no palco, a palavra e suas reverberações estabeleciam um diálogo direto com o público, potencializando a criação de imagens persuasivas. Dentro da historicidade do cinema essa dicotomia se mostra muito mais complexa diante das próprias implicações do dispositivo, porém através de um estreitamento de relação com o teatro, indubitavelmente esta passa hegemonicamente a dar ênfase ao intimismo, ao realismo do gesto, à psicologia, instaurando e aprimorando o registro naturalista. Já no cinema moderno, temos como primeiro grande referencial de uma contracorrente, a obra e os princípios estéticos propostos pelo cineasta francês Robert Bresson, que queremos evidenciar como influência imediata e paradoxal a Eugène Green. A aproximação entre as metodologias de atuação de Bresson e Green se entrelaçam através da evidente busca pela visualidade de algo enigmático que é concebida e não representada. O peso da palavra na obra de Green não se propaga apenas através do trabalho elaborado de entonação, nem através do espaço deixado pelo esvaziamento da eloquência expressiva do rosto. Sua potencialidade é resignificada muitas vezes pelo gesto, ou pela ausência dele, prezando pela minúcia da impassibilidade. Muitas das escolhas formais do cineasta são recriações do teatro barroco, porém, nos parece essencial para entender o cinema contemporâneo esse embate anacrônico de uma metodologia clássica como meio de apreender o que escapa da percepção da experiência espectatorial na modernidade. |
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Bibliografia | AMIEL Vincent. Le corps au cinema - Keaton, Bresson, Cassavetes. Paris : PUF, 1998. |