ISBN: 978-65-86495-01-0
Título | A dramaturgia dos corpos na mise-en-scène de Wong Kar Wai |
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Autor | PAULA TELLES DE MENEZES FARO |
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Resumo Expandido | O Grande Mestre (Yīdài zōngshī, 一代宗师 - 2013) dirigido pelo cineasta de Hong Kong, Wong Kar Wai é o segundo filme em que o diretor trata de um tema bastante comum na cultura chinesa, as artes marciais. O primeiro foi Cinzas do Passado, de 1994. Embora o filme de Wong Kar Wai tenha recebido este título em inglês e português (O Grande Mestre) quando olhamos para o título original a tradução não seria exatamente esta. Yīdài zōngshī poderia ser traduzido também como Uma geração de Mestres. Faremos referência a ele usando esta tradução, já que acreditamos que é disso que o filme trata e também porque permite um distanciamento com relação à franquia com o mesmo título estrelada por Donnie Yen. Uma geração de Mestres levou dez anos para ser realizado e finalizado. Wong Kar Wai fez uma pesquisa extensa viajando por toda a China, entrevistando os mestres das antigas gerações e tradições e se aprofundando neste universo. Todos os atores passaram por treinamentos tradicionais e árduos para incorporar os estilos de artes marciais retratados no filme. Um dos seus objetivos para realizar o projeto, como diz no documentário que foi gerado a partir da pesquisa, era mostrar através do filme o significado da tradição das artes marciais chinesas e o pensamento e o comportamento que dão embasamento a elas, algo que hoje já não se encontra por lá. O filme trata de um período histórico marcado pela transição de uma concepção tradicional das artes marciais para aquilo que viria a ser uma concepção moderna. Isto está explícito não apenas na narrativa e na história do filme mas fundamentalmente na composição da dramaturgia dos corpos dos atores na mise-en-scène. Não poderia ser diferente tratando-se de Wong Kar Wai, que sempre tem os corpos dos atores como elementos narrativos. Na China, a Arte Marcial é uma cultura, um pensamento que é transmitido através de uma prática corporal e do movimento. Os sistemas de arte marcial como o Xing Yi, Ba Gua, Taiji e Wing Chun (alguns dos estilos retratados no filme) podem ser considerados como corpos de conhecimento estruturados que se atualizam no mundo através dos processos históricos e políticos. Diferente das concepções e imagens orientalistas evocadas pelos filmes de arte marcial da grande indústria hollywoodiana e também de Hong Kong, o filme de Wong Kar Wai procura através dos elementos da linguagem cinematográfica (movimentos de camêra, velocidade, música, montagem, etc.), tendo como primeiro recurso o movimento do corpo dos atores e suas coreografias em cena, aproximar o espectador destas expressões culturais, como elas se estruturam e como se transformam para permanecerem vivas. Para analisar o filme desde esta perspectiva a teoria corpomídia nos dará embasamento teórico para compreender estes processos e relações em profundidade, "Algumas informações do mundo são selecionadas para se organizar na forma de corpo - processos sempre condicionado pelo entendimento de que o corpo não é um recipiente, mas sim aquilo que se apronta nesse processo co-evolutivo de trocas com o ambiente." (GREINER, 2013). A dramaturgia do corpo dos atores em mise-en-scène é fundamental para compor a narrativa de um filme que trata do movimento de transição de um período histórico, da transformação dos corpos em movimento que modificam uma cultura e uma expressão como as artes marciais chinesas. Fazendo isto, o filme se torna um meio para a compreensão do pensamento tradicional, sua relação com a arte marcial e seu processo de transformação, permitindo uma aproximação de saberes que vão além das dicotomias ocidente/oriente, corpo/mente, teoria/prática e natureza/cultura. Torna-se um registro que preserva e resgata a memória de um tempo perdido. |
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Bibliografia | GREINER, Christine. Leituras do Corpo no Japão e suas diásporas cognitivas, São Paulo, SP: n-1, 2015. |