ISBN: 978-65-86495-01-0
Título | O jogo com a ficção em Arábia, António Um Dois Três e As Boas Maneiras |
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Autor | Leonardo Bomfim Pedrosa |
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Resumo Expandido | Identificamos no período contemporâneo uma recorrência de desdobramentos da ficção a partir do jogo com o duplo e com o múltiplo. Nessa perspectiva, ainda na primeira década dos anos 2000, destacam-se obras de realizadores como Apichatpong Weerasethakul, David Lynch, Hong Sang-soo, Miguel Gomes, José Luís Guerín, Raya Martin, Mariano Llinás. Em diferentes contextos cinematográficos, o período contemporâneo lida com ficções que se abrem à vertigem. O "era uma vez" dá lugar ao "eram duas (ou muitas) vezes". As complexidades desse cinema podem ser investigadas a partir da intervenção de um dos personagens de A Cara que Mereces (2004), o primeiro longa-metragem de Miguel Gomes: “não me vais contar uma história sem que eu saiba o fim desta”. A resposta do homem que narra a história sem final pode ser encarada como um manifesto sobre o modo como o cinema lida com as ficções no novo século: “para ouvir uma história é preciso ter paciência com as novas histórias que surgem antes do fim”. Na conversa do filme português, identificamos três possibilidades de definição para as recorrências que assombram a criação contemporânea: (1) uma história será contada e seu relato estará evidenciado no filme, a partir de recursos como a metalinguagem e a mise en abyme; (2) essa história não chegará ao fim, haverá uma interrupção e teremos contato apenas com um fragmento que nem sempre estará relacionado a um todo; (3) haverá outra história que surge a partir do choque de diferenças e de semelhanças. Nesta comunicação, apresentaremos a análise do jogo com as ficções a partir da fragmentação e dos desdobramentos narrativos de três filmes brasileiros contemporâneos: Arábia (2017), de João Dumans, Affonso Uchoa; António Um Dois Três (2017), de Leonardo Mouramateus, e As Boas Maneiras (2018), de Juliana Rojas e Marco Dutra. Em Arábia, o coming-of-age de um adolescente sugerido na primeira parte do filme é interrompido para que a obra ganha outra referência política, o "coming-of-rage" de um trabalhador. O garoto descobre um caderno com histórias narradas e o filme torna-se outro. António Um Dois Três recorre ao teatro para apresentar três variações, a partir de repetições e diferenças, das andanças de um jovem português e seu amigo, um imigrante brasileiro, que vacilam pelas ruas de Lisboa. Ainda mais radical, As Boas Maneiras narra a história de amor entre uma jovem do interior e a empregada doméstica e chega duas vezes a um desfecho. Há duas narrativas - separadas por um número musical - que apresentam começo, meio e fim rigorosamente delimitados. Entre os diversos estímulos provocados pelos filmes, interessa-nos, neste trabalho, investigar especialmente duas questões: 1 - O modo como cada filme responde ao dilema contemporâneo identificado por Horacio Muñoz Fernández (2017): “como contar uma história depois de ter visto e lido todas as histórias?” 2 - A retorno do desejo de "arquitetar conflitos, tramas, construir discursos e relações de significação", em contraste com as proposições das narrativas sensoriais identificadas por Osmar Gonçalves (2014), para abordar temas que golpeiam a sociedade brasileira atual. |
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Bibliografia | AUMONT, Jacques. Les limites de la fiction. Paris: Bayard Culture, 2014 |