ISBN: 978-65-86495-01-0
Título | O sujeito partido: história, revanche e violência |
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Autor | Raul Lemos Arthuso |
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Resumo Expandido | Falar sobre as transformações do Brasil nas últimas duas décadas passa inevitavelmente por explorar as implicações da macropolítica na micropolítica. O Brasil democrático é um país de contradições e conflitos que foram sendo apaziguadas até seu ponto limite, com uma Constituição “Cidadã” que organizou um sistema de securidade social e representação política que visavam reduzir as desigualdades históricas, mas nunca foram implantados plenamente. Originários de universos completamente distintos - um de um cinema marginal da periferia de Brasília, outro do centro do sistema de produção em grande escala do Rio de Janeiro – as obras analisadas nessa comunicação são duas faces do destino da nação que passa por sujeitos comuns como nós. Branco Sai Preto Fica, de Adirley Queirós, parte da experiência real de violência policial sofrida por dois personagens – Markim e Chokito – cujos corpos ficam marcados de forma irreparável e um terceiro personagem – Dimas Cravalanças, agente do futuro que volta no tempo para recolher provas que incriminem o Estado brasileiro a fim de indenizar as populações negras vítimas de exclusão e violência estatal – que fica preso no passado (nosso presente), apartado de seu tempo histórico. A articulação dessas três trajetórias se dá a partir da subjetividade partida – da comunidade, do espaço público, das possibilidades de um outro sujeito pleno – das personagens em busca da reparação impossível de suas vidas. O filme, por sua vez, também se desdobra numa série de partições: entre centro e periferia, passado, presente e futuro, imaginário e concreto, ficção e documentário, memória e presença. Já os dois Tropa de Elite, de José Padilha, mostram um sistema falido: a polícia militar do Rio de Janeiro. Descrevendo com atenção seu funcionamento, a polícia do Rio torna-se representação de todo o sistema político brasileiro na contemporaneidade. Nesse contexto, a solução está no BOPE, fragmento da corporação que, dentro do sistema, se coloca à margem dele: seus membros passam por um processo rigoroso de seleção, que envolve tirar os corruptos e os fracos da disputa, permanecendo apenas os policiais com força física e também de espírito. Cria-se um “mito da pureza” para justificar o heroísmo violento da corporação e seu caráter especial de extermínio “contra tudo o que está aí”. Dentro desta narrativa do sistema, existe um sujeito fragmentado: Capitão Roberto Nascimento, dividido entre o pai de família e o capitão dessa corporação assassina. As questões de corrupção policial, conflitos de classe e a fábula de escolha de um substituto no batalhão estão mediadas por esse sujeito fraturado que narra o filme: partido entre Roberto, identidade do lar, e Nascimento, nome de guerra, um dos dois deve ser violentamente suprimido. O conflito de Roberto Nascimento é a questão importante dos afetos contraditórios de sujeitos comuns no Brasil contemporâneo: a briga entre a esperança num projeto coletivo, orgânico e social - não à toa, Roberto está para ter seu primeiro filho - e o “reboot” do sistema, matando indiscriminadamente até limpar toda a sujeira, com as próprias mãos. Tanto em Branco Sai Preto Fica quanto Tropa de Elite, há o desejo de reparação que se concretiza numa explosão violenta: nos filmes de Padilha, a vitória da máquina de matar sobre o pai de família leva a um caminho de vingança que vai justificar a tortura e o extermínio dos pobres e a justiça com as próprias mãos contra um político corrupto; em Branco Sai..., a agonia das personagens leva a um ato terrorista de revanche explosiva contra o centro do poder como a última opção para (re)começar “tudo o que está aí”. Isso é representativo de uma tendência forte do cinema brasileiro contemporâneo em apostar na violência como catarse, uma força de reparação que se coloca à margem e como caminho frente a um contrato social no limite de suas contradições. |
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Bibliografia | ADORNO, Sérgio: “O Monopólio estatal da violência na sociedade brasileira contemporânea”. In: MICELI, Sergio: O que ler na ciência social brasileira 1970-2002. Volume IV. |