ISBN: 978-65-86495-01-0
Título | Visão em colapso: corpo e finitude entre Jarman e Saramago |
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Autor | Marcia de Noronha Santos Ferran |
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Resumo Expandido | Nossa proposta é examinar o estatuto da visão e da sua falta (cegueira) como deflagrador de limites e potenciais para sociabilidade e para a criação cinematográfica através dos filmes A Cegueira (Fernando Meirelles) e Blue de Derek Jarman. A temática da visão vem sendo crescentemente discutida enquanto meio de controle, gestão da sociedade e freio às pulsões mais anímicas. O ápice deste fenômeno é imaginado, por exemplo, no romance Ensaio sobre a Cegueira de José Saramago. No livro, o escritor, através de uma parábola, leva suas personagens a uma situação limite onde ter visão significa guiar, decidir, julgar. No filme baseado no livro, ter visão também acarreta ter o triste privilégio de se assistir ao colapso da civilidade, intensificado para o espectador como o colapso da cidade imaginária filmada. Na criação fílmica e poética, o aspecto “visual” do audiovisual merece comumente estudos fenomenológicos e semióticos. Nesse sentido, ao idealizar um filme que exibe exclusivamente uma tela monocromática azul, quando estava à beira da perda total da visão, Derek Jarman - em Blue - legou ao estudo do cinema de ensaio ou cinema de exposição um desafiante manifesto sobre os limites e a autonomia da criação fílmica. O filme-ensaio trata tanto da finitude física como também da finitude de modelos fílmicos, ao abrir mão de imagens sem abrir mão de narrativa. Assim, nos lega ao mesmo passo a latência da inventividade. Abordaremos aquele colapso de civilidade impetrado essencialmente aos corpos das personagens de Saramago, contrastando-o com a ideia de hospitalidade de Emmanuel Lévinas. Já em Blue, é o corpo do próprio diretor que testemunha os colapsos. Trata-se portanto de uma miríade de colapsos que remete a sentidos diversos tais como ética/violência e corpo/calamidade urbana. Vemos várias possíveis relações entre a cidade em colapso imaginada em Ensaio sobre a Cegueira e as cidades contemporâneas, em que cotidianamente se dão episódios de incêndios e revoltas, estupros, transito caótico e, essencialmente, a finitude da legitimação política. Interessa igualmente produzir uma aproximação à ordem do fantástico, em que a cegueira branca de Saramago evoca a problemática ética da hospitalidade levantada por Emmanuel Lévinas, para quem o sentido da visão é antes de tudo a possibilidade de encontro com o rosto do outro, e é neste encontro que reside o limiar entre paz e Guerra. Como aponta Jarman, aproxima-se assim a tela azul fixa aos limiares entre cinema e arte. Enfim, almejamos abrir um diálogo ficcional entre Saramago e Jarman a respeito de finitudes e cegueiras através das abordagem das corporeidades. |
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Bibliografia | BELLOUR, Raymond. La querelle des dispositifs. Cinéma- installations, expositions. Paris : P.O.L, 2012. |