ISBN: 978-65-86495-01-0
Título | Bomba de som e música: o discurso distópico de Branco Sai, Preto Fica |
|
Autor | Alexandre Camargo Scarpelli |
|
Resumo Expandido | O filme Branco Sai, Preto Fica (2014), de Adirley Queirós, constrói o cenário da cidade de Brasília em um futuro próximo, indefinido, distópico e violento. Apesar do hibridismo com a linguagem documental, pode ser entendido como uma obra de ficção científica brasileira. Nesse sentido, nota-se um importante papel do som e da música no desenvolvimento do caráter extrapolativo da estória: uma das motivações principais dos personagens do enredo é explodir o Palácio do Planalto com uma bomba de som e música, construída com sucata tecnológica e composta de paisagens sonoras e músicas da região da Ceilândia, populares e socialmente marginalizadas. Percebe-se, também, a confecção de sons para diversos elementos tecnológicos do filme – precários, em consonância com a estética de distopia “terceiro-mundista” – e a "polícia do bem-estar social", autoridade policial cuja presença se dá exclusivamente na banda sonora; apenas para citar alguns exemplos de elementos sonoros e musicais que compõem o filme. No entanto, trata-se de uma narrativa de ficção científica não apenas (propositalmente) distante das convenções norte-americanas, mas, imbuída de questões estéticas e sociais pertinentes à realidade brasileira. Avaliar essa obra nos mesmos paradigmas pelos quais são observados filmes canônicos da ficção científica internacional pode acentuar ainda mais a desvalorização da ficção científica brasileira perante obras consideradas “modelares” do gênero. São necessárias outras perspectivas quanto às funções do som e da música em um filme de ficção científica. Sendo assim, este trabalho pretende observar o papel do som e da música na construção do discurso fílmico de Branco Sai, Preto Fica, especificamente naquilo que o configura como narrativa de ficção científica, mas, ao mesmo tempo, pautando-se por especificidades da ficção científica brasileira. Primeiramente, faz-se oportuna a utilização de teorias da ficção científica, adaptáveis a diferentes mídias e diversos contextos culturais e que buscam encontrar no discurso a essência definidora do gênero. Os elementos ausentes que estimulam a imaginação especulativa (ANGENOT, 1979), a composição do fator de estranhamento cognitivo e suas potencialidades críticas (SUVIN, 1972) e a abertura a uma grande variedade de formas podem ser alcançadas lançando mão de teorias próprias da investigação acerca do gênero. Ao considerar som e música como elementos constituintes do discurso fílmico, pode-se compreender melhor seu papel na composição dessa essência discursiva do gênero. Mais especificamente, pretende-se avaliar o trabalho de som e música do filme com foco nos aspectos mais pertinentes à ficção científica brasileira, sua mitologia, seus temas e ícones específicos. Mary Elizabeth Ginway, em seu livro Ficção Científica Brasileira, investiga obras literárias de várias fases do gênero entre 1960 e 2000 sob uma perspectiva que considera esses textos como parte de um discurso maior sobre nacionalidade e mitos culturais (GINWAY, 2005). Apesar de estudar majoritariamente obras literárias, Ginway entende seus objetos de maneira ampla, como artefatos culturais, realizando um mapeamento que serve de suporte a este trabalho. Pretende-se demonstrar, portanto, que o desenho de som e as estratégias musicais de um filme brasileiro de ficção científica – mesmo afastando-se das convenções sonoras de sua contraparte anglo-americana – continuam em harmonia com aspectos essenciais do discurso narrativo que caracteriza o gênero, ao mesmo tempo em que cristalizam elementos particulares da mitologia brasileira de ficção científica. Esta pesquisa aponta para uma análise sonora que escape da busca pela iconografia e estratégias formais da tradição anglo-americana de filmes do gênero, procurando observações mais adequadas a cinematografias de ficção científica externas à hollywood, como a europeia, a latino-americana de maneira geral e, especificamente no recorte deste trabalho, o cinema brasileiro de ficção científica. |
|
Bibliografia | ANGENOT, M. The Absent Paradigm: An Introduction to the Semiotics of Science Fiction (Le Paradigme absent, éléments d'une sémiotique de la SF). Science Fiction Studies (1979) Volume: 6, Issue: 1, Pages: 9-19 |