ISBN: 978-65-86495-01-0
Título | A montagem de filmes de família como construção de lugar de memória |
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Autor | Maíra Magalhães Bosi |
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Resumo Expandido | O presente trabalho analisa a retomada de filmes de família Super-8, pela montagem do curta-metragem ensaístico Supermemórias (2010), como possibilidade de construção de lugar de memória para a cidade que serve de pano de fundo para tais imagens, Fortaleza (Ceará). Emprestamos a noção de lugares de memória do historiador Pierre Nora, que os compreende como “lugares, efetivamente, nos três sentidos da palavra, material, simbólico e funcional, simultaneamente, em níveis variados” (NORA, 1984, p. XXXIV, tradução nossa) que respondem a um fenômeno de aceleração contemporâneo, sendo testemunhas de outra época, criados com objetivo de “parar o tempo, bloquear (o trabalho do) esquecimento, fixar um estado de coisas, imortalizar a morte, materializar o imaterial” (Ibid., p. XXXV, tradução nossa). Dirigido pelo cineasta cearense Danilo Carvalho, Supermemórias é composto, exclusivamente, por filmes de família Super-8 realizados em Fortaleza, entre as décadas de 1960 e 1980. Tal material fílmico amador foi reunido por Carvalho a partir de uma chamada pública que teve como mote a evocativa frase "Mais uma memória para uma cidade sem lembranças". Cabe lembrar que os filmes de família têm circulação restrita a esse grupo e registram acontecimentos tidos como especiais (aniversários, nascimentos, etc.), com objetivo de construir memória familiar. Portanto, ao recorrer a esse tipo de imagem, Carvalho sugere uma interface da memória de Fortaleza com as memórias de seus habitantes. Essa intuição de Carvalho e seu gesto criativo chamam ainda mais atenção se levarmos em conta que um filme de família recita fragmentos de ações onde “o objeto, o personagem ou o evento em questão tenha sido julgado digno, por aquele que operava a câmera, de figurar na coleção de lembranças familiares” (ODIN, 1995, p. 28) e que “aberto nas duas extremidades, o filme de família parece condenado a uma incompletude definitiva” (Ibid.). Ou seja, originalmente, esse tipo de filme prescinde de qualquer gesto de montagem cinematográfica por ser destinado a um grupo específico, capaz de completar o sentido de suas imagens com um repertório de lembranças e narrativas compartilhadas a priori. Nessa linha, compreendemos que, enquanto estiveram restritos à circulação privada da esfera familiar, os filmes Super-8 retomados por Carvalho poderiam representar lugares de memória apenas para as respectivas famílias ali retratadas. Por outro lado, a montagem de Supermemórias trouxe tais imagens à esfera pública, evidenciando que tais filmes de família não contêm apenas aquilo que era foco de interesse de quem os filmou, mas “reúnem também o impensado de uma época, a parte ininteligível do evento para seus contemporâneos” (LINDEPERG, 2013, p.11). E, sendo “a condição necessária para assegurar um caráter público a essa entidade privada [os filmes de família]” (BLANK, 2015, p.194), foi a montagem de Supermemórias que possibilitou a elaboração de um novo lugar de memória para Fortaleza, composto pelos filmes de família reunidos por Carvalho. Nesta comunicação, discutiremos o método de pesquisa traçado para analisar a retomada de filmes de família em Supermemórias. Tal procedimento metodológico, fundamentalmente, entrecruza a montagem de sequências desse curta com os filmes Super-8 originais e as lembranças dos cineastas amadores e seus familiares, que fomos entrevistar. Procuramos, assim, evidenciar que a montagem reelaborou o sentido original das imagens Super-8 retomadas por Carvalho, fazendo com que perdessem parte daquilo que tinham de específico (e particular) em prol da criação de uma narrativa pública. |
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Bibliografia | BLANK, Thaís. 2015. Da tomada à retomada: Origem e migração do cinema doméstico brasileiro. 207 f. Tese (Doutorado em Comunicação e Cultura) – Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. |