ISBN: 978-65-86495-01-0
Título | Ed.,psicologia e cinema:reflexões a partir de Jonas e o circo sem lona |
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Autor | Fernanda Omelczuk Walter |
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Resumo Expandido | A relação do cinema com a psicologia se confunde com a própria história do cinema se pensamos na sétima arte como o “inconsciente óptico” capaz de nos mostrar o invisível que atravessa o cotidiano (BENJAMIN, 2012). Machado (1997) considera curioso que o pai da psicanálise não tenha se referido ao cinema para ilustrar o funcionamento psíquico, sendo sua teoria tão próxima deste dispositivo. Outras vertentes de diálogo são análises sobre mecanismos de projeção e identificação do espectador com a visão da câmera, com personagens e enredos (AUMOUNT; MARIE, 2004). Além disso o cinema como produtor de subjetividade é uma possibilidade de subverter produções capitalísticas massificadas na direção da singularidade (GUATTARI; ROLNIK, 2005) especialmente para a escolha dos filmes que exibimos nos contextos de psicologia e educação. É nesse sentido que pensamos o filme Jonas e o circo sem lona (2015) de Paula Gomes, como um cinema que conjuga em conteúdo e estética modos outros de perceber e configurar problemáticas da psicologia da educação. O filme narra o envolvimento de Jonas com o circo que ele mesmo monta, constrói, ensaia, divulga, junto aos amigos no quintal de sua casa. Jonas constrói o circo com os “restos do mundo adulto” – pedaços de arquibancada, lonas velhas, o trapézio do circo onde sua família trabalhava (BENJAMIN, 2002). Esse universo, que pode parecer devaneio de fantasia infantil, é concreto e envolvente no filme, que nos mostra a dedicação, a autonomia, a disciplina de Jonas com a rotina dos ensaios, montagem, criação dos espetáculos. A “brincadeira” é vivida com compromisso e seriedade em contraste com as acusações dos adultos acerca de um Jonas irresponsável e relapso com os estudos e a escola. Assim, ao dar a ver a história de Jonas, Paula provoca o real com a presença da câmera e coloca em circulação traços de diferentes regimes da imagem da infância e da escola na contemporaneidade. A diretora da instituição, por exemplo, reclama que a presença da equipe documentarista na escola altera o comportamento de Jonas, inventa um novo Jonas preferimos dizer. Ela considera um mal exemplo filmar um aluno que não tem um bom desempenho nas provas e tarefas. O cinema, em sua visão, deveria manter uma correspondência mais direta com o que percebia, “representar o real” e não intervir nele (RANCIÈRE, 2009). Mas o que a diretora faz é suspender modos de percepção das “crianças problemas” comumente compartilhados pela comunidade escolar. Suas imagens colocam em circulação um menino atento, interessado e sensível. A câmera de Paula filma desde o início a favor de Jonas, uma câmera intencionada e assertiva, que corre com ele os riscos dessa relação - se tornando ela também uma personagem da história, que intervém junto à mãe para que o deixe ir para o circo, que consola Jonas pelo fracasso de sua empreitada – numa câmera tátil, que não só o filma, mas também lhe toca, literalmente, pelas mãos a acaricia-lo em consolo (COMOLLI, 2008). O interesse do menino pelo circo - a mais marginal das artes, um não lugar marcado pela instabilidade e o nomadismo - tenciona ainda mais a relação com a escola – lugar do conhecimento oficial, das certezas e busca por segurança. Não se trata de uma criança problema e “preguiçosa”, mas um menino que opta por abandonar a segurança e conforto da escola, o equilíbrio e estabilidade das ciências, como tantas vezes argumenta sua mãe, por uma vida itinerante que exige dedicação e trabalho. No circo o risco é condição eminente do artista em diferentes dimensões: riscos financeiros, físicos, emocionais, simbólicos (GOUDARD, 2009). Jonas escolheu viver esses riscos. Paula assumiu os riscos do “engajamento e fricção com o mundo”. Que riscos a presença de Jonas e desse(s) cinema(s) provocam em nossa percepção sobre as crianças problemas? Sobre nossas expectativas acerca do discurso psi sobre essas crianças? Sobre nossas percepções acerca da escola, da aprendizagem, da infância e do próprio cinema |
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Bibliografia | AUMONT, J. MARIE, M. A análise do filme. Lisboa: Edições Texto & Grafia, 2004. |