ISBN: 978-65-86495-01-0
Título | Juliana Rojas e Marco Dutra: um lobisomem brasileiro no cinema |
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Autor | Esmejoano Lincol da Silva de França |
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Resumo Expandido | Parte da filmografia dos diretores Juliana Rojas e Marco Dutra é composta de imagens aterrorizantes que povoam o nosso imaginário coletivo. As narrativas fílmicas desses diretores, que frequentemente flertam com o horror e o suspense, podem recorrer à lendas urbanas consagradas na contemporaneidade, como a suposta malignidade presente no boneco do personagem Fofão – imagem do filme "Quando Eu Era Vivo" (2014), assinado apenas por Dutra –, ou aos mitos mais ancestrais, como a lenda do lobisomem, personagem mítico explorado nos filmes "Trabalhar Cansa" (2007) e "As Boas Maneiras" (2018) – estes assinados por ambos os diretores. No entanto, o modo como a imagem do lobisomem aparece nas duas obras acima difere da abordagem regular das obras de horror e de suspense que utilizam esta lenda. Em "Trabalhar Cansa", por exemplo, o mito é despido de corporeidade e se apresenta de forma etérea, quase sugerida: o lobisomem não aparece como um monstro feroz, que faz vítimas e que só pode ser derrotado com uma bala de prata, segundo a lenda; ele surge na forma de um cadáver, concretado à parede do supermercado que Helena (Helena Albergaria) e Otávio (Marat Descartes) tentam fazer prosperar. O monstro exercita seu poder destrutivo não mais através de um ataque direto, mas como uma presença maligna assombrando o local. Já no segundo longa que destacamos neste painel, "As Boas Maneiras", a figura do lobisomem aparece personificada, tanto na figura de Ana (Marjorie Estiano), transformada em monstro ao se relacionar com um homem desconhecido, quanto na figura de seu filho Joel (Miguel Lobo), criado por Clara (Isabél Zuaa). Mas, nesse filme, outro dado a ser considerado no exercício imagético do mito é o atravessamento das questões sociais. Em "As Boas Maneiras" o lobisomem marca presença ora como personagem, ora como elemento que sedimenta e altera relações entre diferentes classes sociais. A existência simbólica do lobisomem em "Trabalhar Cansa" também pode ser lida no plano das discussões sociológicas, funcionando como uma espécie de "entrave econômico" para os microempresários Helena e Otávio, ajudando a discutir, por conseguinte, a economia e as relações de trabalho notadas no país. O enviesamento sociológico desse gênero fílmico não é novidade. Daniel Medeiros (2016) rememora as primeiras experiências do horror no cinema, notadas durante o expressionismo alemão da década de 1920, como "O Gabinete do Dr. Calligari" (1920) e "Nosferatu" (1922) (MEDEIROS, 2016); estas foram impactadas, sobretudo, pela Primeira Guerra Mundial. Mais recentemente, o realizador americano Jordan Peele pode discutir através dos seus filmes "Corra!" (2017) e "Nós" (2019) os horrores da sociedade americana: o racismo e a xenofobia fizeram as vezes de monstros nas obras deste diretor. Tendo exposto as peculiaridades sobre o exercício imagético desta figura mitológica em "Trabalhar Cansa" e "As Boas Maneiras", o objetivo desse painel é analisar a ressignificação do mito do lobisomem a partir da inserção simbólica ou presentificada desta criatura nos filmes Juliana Rojas e Marco Dutra e o atravessamento de questões sociais destes filmes mediada pela presença etérea ou corporificada do personagem mítico. Para isso, resgataremos através das Estruturas Antropológicas do Imaginário, classificação de arquétipos e símbolos proposta por Gilbert Durand (2012), as imagens que possivelmente deram origem ao mito e compararemos este resultado com a ressignificação imagética notada nas obras Rojas e Dutra. Em seguida, faremos o recorte das questões sociológicas apresentadas nos filmes, tentando entender como a figura do lobisomem pode enriquecer e ajudar essas narrativas no tocante à exposição dos problemas socioeconômicos do país. De modo a sedimentar nossa bibliografia sobre os filmes de horror e sua relação com o social, recorreremos a trabalhos como os de Daniel Medeiros (2016) e Igor Noboa (2010). |
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Bibliografia | DURAND, Gilbert. As estruturas antropológicas do imaginário: introdução à arquetipologia geral; tradução de Hélder Godinho. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2012. |