ISBN: 978-65-86495-02-7
Título | A mulher prostituta no documentário "Mulheres da Boca" (1982) |
|
Autor | Hanna Henck Dias Esperança |
|
Resumo Expandido | Com o processo de redemocratização no final dos anos 1970 e início da década de 1980, diversos movimentos sociais puderam se reorganizar politicamente em torno das suas pautas específicas. Foi nesse período transicional que as mulheres encontraram espaço para discutir e reivindicar objetivos particularmente feministas, ao mesmo tempo que: "outras forças sociais adquirem visibilidade no país, trazendo, com maior expressão, a defesa [...] dos direitos sexuais e a interseccionalidade entre gênero e raça para a área pública, ressaltando essas pautas na agenda política do país. [...] Após anos de divórcio entre a sociedade civil e o estado, a agenda dos direitos humanos e da igualdade das mulheres já não ecoava tão somente nas ruas, posto que feministas davam um primeiro passo em direção ao estado..." (PITANGUY, 2019, p. 84) Para a socióloga Jacqueline Pitanguy, o contexto privilegiou a atuação e articulação entre o movimento das mulheres e o Estado, resultando, em 1985, na criação do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (CNDM), órgão federal autônomo que tinha como intuito assegurar os direitos femininos na nova Constituição. As demandas do CNDM abrangiam o acesso da mulher rural à titularidade de terras, a gratuidade dos métodos contraceptivos, a discriminação das estatísticas por sexo, raça e cor, além da criação de delegacias e albergues especializados. (PITANGUY, 2019) Esses são apenas alguns exemplos que refletiam o engajamento ativo dos grupos feministas com outros grupos sociais, como parte da compreensão da vivência feminina como algo plural e multifacetado, que abarcava mulheres fora do escopo branco de classe média. Assim, o período da década de 1980 envolve um primeiro passo à legitimação de outras vivências junto às políticas públicas e ao âmbito da representação, incluindo aquelas de figuras marginalizadas. Nesse sentido, a comunicação proposta tem como objetivo se debruçar sobre a análise do documentário "Mulheres da Boca" (Cida Aidar e Inês Castilho, 1982), curta-metragem que se insere no contexto aqui exposto por trabalhar a temática da mulher marginalizada através da prostituta. O filme, ao focar na prostituição ainda no início dos anos 1980, se articula a um movimento que dava seus primeiros passos em direção à visibilidade midiática e política, já que, como afirma Aparecida Fonseca Moraes (2020), foi apenas no fim da década que novas ideias sobre a prostituta passaram a circular nos meios de comunicação, nas organizações governamentais e no meio acadêmico e artístico. Ainda assim, Moraes atenta para o horizonte político e simbólico instaurado no processo de redemocratização do país, que permitiu que a discussão acerca da prostituição avançasse. Para ela, é preciso considerar “a diversificação das lutas pelo reconhecimento de direitos sexuais e, principalmente, a articulação dessas lutas com a reorganização de movimentos homossexuais e com a manifestação de novas identidades coletivas”. (MORAES, 2020, p. 257) É na chave de visibilizar uma percepção mais complexa da prostituta que o documentário de Aidar e Castilho se desenvolve. Na zona do baixo meretrício do centro de São Paulo, onde também se localizava o polo de produção cinematográfico da Boca do Lixo, "Mulheres da Boca" traça um paralelo entre o universo da prostituição e os filmes eróticos da Boca, permitindo uma desmitificação, através de uma estratégia que mistura realidade e ficção, dos estereótipos que envolvem a figura das prostitutas, enquanto também faz denúncias contundentes acerca da condição exploratória e violenta que elas vivenciam em seu cotidiano. |
|
Bibliografia | ABREU, Nuno Cesar de. Boca do Lixo: cinema e classes populares. 2002. 808 f. Tese (Doutorado em Multimeios) – UNICAMP, Campinas. |