ISBN: 978-65-86495-02-7
Título | Cinema incômodo: Cafarnaum, realismo intensificado e emoções críveis |
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Autor | Gabriel Perrone Vianna |
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Resumo Expandido | No arranjo discreto de elementos sugestivos a criar uma experiência sensorial gradativa de um desconforto de difícil reconhecimento de suas causas pelo espectador, encontra-se um cinema que se manifesta como uma experiência inicialmente desarmônica e se revelam como uma perturbação muito direta. Gera um forte desejo no espectador de solução das angústias representadas na tela e experimentadas no corpo enquanto vai aos poucos deixando claro que a satisfação desses desejos irá revelar outras fontes de perturbação. Esse desconforto construído será alimentado por estruturas muito maiores de manipulação do espectador. Ao invés de apresentar quaisquer soluções apaziguadoras, irão permanecer no registro do desagradável e se configurar propriamente em um cinema do incômodo. Se diferencia do extremo, do horror, da pornografia ou do melodrama porque não possui a dimensão catártica ou eletrizante comumente característica do cinema de gênero. Em oposição, maximiza a possibilidade de gerar o desagrado e o potencial de frustrar os espectadores que preferem a clara distinção dos agrupamentos. O cinema do incômodo rompe com as convenções que orientam para o mais provável e esperado. Ao constatar tais efeitos, a presente proposta de comunicação investiga os fatores de construção fílmica que possam atender às questões: Como definir esse cinema do incômodo? De que maneira provoca tais efeitos? Um dos principais efeitos identificados como necessário para a comunicação entre obra e espectador dos variados sentimentos de tensão, angústia, ou seja, de afeto à integridade emocional do público é o de identificação e credibilidade ante a personagens, situações e ações apresentadas na tela. Para isso, a pesquisa percorre os conceitos recentemente produzidos sobre um retorno do realismo e as discussões sobre este retorno. Mesmo resgatando conceitos de teóricos como André Bazin e Siegfried Krakauer, uma nova abordagem de realismo a levar em consideração obras recentes do cinema mundial atualizam questões e propõem novas visões. É o caso de Lúcia Nagib com World cinema and the ethics of realism (2011), explorando questões da construção de uma realidade fictícia tangível para um cinema de emoções intensas e críveis. A autora aborda os modos realistas de produção e endereçamento típicos das novas manifestações cinematográficas, rompe com as categorizações de ficção e documental, cinema de arte e cinema mainstream para pensar ilusionismo, identificação, aparato, efeito de alienação, apresentação e representação, indispensáveis para o início de uma conceitualização de questões estéticas que permeiam os ápices da expressão criativa e apelo do cinema do incômodo. A preocupação ética com a fidelidade se revela a partir da ideia de um realismo corpóreo que se dá por um comprometimento físico que a cena implica aos corpos e confere verdade e a dimensão realista do filme que reside nessa entrega, independentemente de sua dimensão ficcional. Assim, a atenção do espectador se liga à existência física, corporal, do ator e, ao mesmo tempo, migra da ficção para os fatos narrados na história. Salienta que o objetivo, portanto, não está na captura da realidade e sim na produção de um “real conceitual” no mundo fenomenológico. É nessa abordagem diferenciada de realismo como construção de realidade de Nagib que o cinema do incômodo parece agir, seja para que a experiência de conflitos e tensões se justifique para o espectador e nele possa se alojar para, então, causar a sensação de ruína, o que nos leva às questões da sensibilização ou comoção. A construção de um “intensificado real ficcional” se dá no apelo do tangível sofrimento e tensão a aumentar o impacto por situações dramáticas elaboradas com todas as aflições de realidade (LOGETTE, 2007). Funcionam pela promoção de uma angústia ante a situações em que a ausência da esperança e o anseio de apenas sobreviver ao instante presente os configuram propriamente como um cinema amargo fortemente propenso ao incômodo. |
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Bibliografia | BAZIN, André. An aesthetic of reality. in. What Is Cinema?, vol. 2, Berkeley: University of California Press, 2004. |