ISBN: 978-65-86495-02-7
Título | Montagem sobreposta: de Movie-Drome (1965) a 3x3D (2013) e 3X3D (2015) |
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Autor | Fabiano Pereira de Souza |
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Resumo Expandido | A sobreposição de imagens é um efeito de montagem habitual desde o início do cinema, em geral camuflado na construção de imagens impossíveis de se registrar com uma câmera, numa única tomada. Raro quando perceptível, se organizado em multitelas, configura exceção ainda maior. No filme 3x3D (França/Portugal, 2013), todas as variações de montagem em sobreposição de imagens são empregadas em 3D. Composta de três segmentos, dirigidos, pela ordem da montagem, por Peter Greenaway, Edgar Pêra e Jean-Luc Godard, a obra explora imagens 3D com proposta experimental e teve circulação restrita a festivais e raras salas de cinema. Lançado apenas dois anos depois, o disco de Blu-ray homônimo 3X3D (EUA, 2015) seguiu a propostas, dividido em três médias-metragens dirigidos pelo americano Ken Jacobs. O diretor atua mais no sentido de romper com a nitidez figurativa da imagem com sobreposições, exposição de luz, transparência, tratamento cromático, divisão de tela e congelamento ou retardamento da velocidade. Ele chega à abstração nos segmentos Blankets for Indians e A primer in sky socialism. Como forma de investigar o eventual ineditismo dessa colagem de material filmado – excluindo-se, portanto, animações – em estereoscopia, pela perspectiva da montagem, uma terceira referência vem do cinema expandido. Trata-se da instalação Movie-Drome (1965), do americano Stan VanDerBeek, remontada em 2017 na exposição Iluminados - Experiências Pioneiras em Cinema Expandido, de 2017, realizada em São Paulo. Na obra, sequências de imagens 2D (em movimento ou não) são projetadas simultaneamente em 360º no interior de uma abóbada. Era um prenúncio da relação atual com imagens. Obras de arte que empregam imagens em movimento, independente de sua fonte, se tornaram envolvidas num fluxo midiático em constante mudança que trata as imagens tão inerentemente variáveis, reprodutíveis e nos casos mais benignos, quanto igualmente mutáveis em casa, no espaço da galeria ou numa webpage. (SUTTON, 2015, p. 192) “No sentido mais geral, a colagem é o inverso da série”, observa Aumont sobre a relação complexa dessa prática corn o instantâneo. “Ela não procura capturar um momento, mas, de saída, vários. A diferença maior é, evidentemente, que esses instantes múltiplos são levados para o interior de uma única e mesma imagem” (AUMONT, 2007, p. 98). No audiovisual, a colagem e a sobreposição se adéquam ao conceito de montagem espacial, que – diferente da temporal, organizada linearmente – atua num sentido de adição e co-existência das imagens (MANOVICH, 2001: 325). Alegar que o 3D hoje deve ser considerado parte e sintoma de uma mudança mais ampla nos nossos valores-padrão sensoriais e de percepção também inclui uma consciência diferente da orientação corporal e localização física. Incorporado em espaços estratificados, navegando múltiplas temporalidades, e interagindo com ambientes ricos em dados, simulados e híbridos, tudo isso provavelmente exige a redefinição do que entendemos por “ver”, por “imagens”, e como diferenciá-las de “representações visuais”. (ELSAESSER, 2015, p. 88-89) Essa redescoberta do 3D implica numa nova configuração cultural para se “viver em e com “imagens”” (ELSAESSER, 2015, p. 74). Entre os aspectos da nova relação no audiovisual está o estilo pós-continuidade, em que “uma preocupação com efeitos imediatos supera qualquer preocupação com uma continuidade mais ampla - seja no nível de tomada por tomada ou na narrativa geral” (SHAVIRO, 2016, p. 51). Nas imagens há ampla integração de gráficos, efeitos sonoros e misturas de imagens de diferentes estilos de filmagem (SHAVIRO, 2016, p. 62). A colagem de projeções de Movie-Drome envolvia o espaço ainda dependente de sua tela côncava. A volumetria de 3x3D e 3X3D explora e espalha espacialmente o que são fragmentos visuais de várias temporalidades. Supera o envolvimento, proporciona imersão em imagens ocas, mas sobrepostas, criando volumes abstratos, inexistentes no mundo natural que o 3D costuma simular. |
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Bibliografia | AUMONT, Jacques. O olho interminável [cinema e pintura]. São Paulo: Cosac Naify, 2004. |