ISBN: 978-65-86495-02-7
Título | Políticas de presença e autoria trans negra no documentário brasileiro |
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Autor | Daniel Zacariotti |
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Resumo Expandido | Com a emergência cada vez mais intensa e consolidada de sujeitos de grupos minoritários a espaços de poder e, de maneira análoga, com a crescente produção massiva de (re)apresentações estético-políticas midiáticas desses sujeitos, é urgente entender quais são as reverberações no espaço do audível e do visível que essas ocupações acarretam. Em outras palavras, não é suficiente apenas celebrar novos acessos a camadas privilegiadas da sociedade por sujeitos historicamente marginalizados: devemos também discutir as estratégias e as possíveis reverberações destas políticas de presença que ocupam as esferas do visível e, especialmente, do audível - focando na possibilidade de se escutar, de fato, o que estes sujeitos reinvindicam. Neste sentido, a presente pesquisa, seguindo algumas ideias levantadas por Muñoz (1996), Rocha (2019) e Sobrinho (2019), visa discutir as políticas de presença e autoria trans negra no documentário brasileiro contemporâneo e, paralelamente, as reverberações efêmeras dessas políticas; para isto, trabalharemos de maneira focada com o documentário Bixa Travesty (Kiko Goifman e Claudia Priscilla, 2018) e a figura (re)apresentada neste audiovisual, Linn da Quebrada. Acreditamos que este documentário seja uma rica fonte de observação das possibilidades interseccionais criadas no paralelismo entre questões de raça, gênero e sexualidade e, por isso, trazemo-no-lo aqui como centro possível para a discussão quanto ao giro causado pelas políticas de presença trans negra, em especial no espaço da autoria. Nossa hipótese é a de que exista um processo de deslocamento, ou ainda, multisitualidade da autoria neste documentário com o objetivo de, potencialmente, gerar uma ampliação da audiovisibilidade protagônica de corpos considerados “outros” - de um ponto de vista normativo, heterocentrado, cis-enquadrado, racista, ação esta a qual chamaremos aqui de autoria deslocada. O motor desta autoria deslocada em Bixa Travesty é, obviamente, Linn da Quebrada. Ao se colocar, não só no filme mas em todas as suas performances midiáticas e socio-políticas, enquanto uma sujeita não passiva, Linn cria um giro, ou melhor, um deslocamento nas esferas de poder do regime audiovisível e, neste documentário, este deslocamento é tomado como estratégia de ampliação. A ação de oclusão consciente, voluntária e, sem dúvidas, inevitável, de Kiko Goifman e Claudia Priscilla, acerca dos espaços de autoria frente à potência da sujeita (re)apresentada Linn da Quebrada, possibilita a consolidação de um espaço de narrativa negra e trans frente aos conservadorismos presentes no Brasil atual. Este movimento de deslocamento não é algo que seja límpido ou intocável por divergências entre sujeito (re)apresentado e realizador-idealizador - claro, quando essas figuras não são a mesma; porém, com o objetivo de gerar políticas de presença que reverberem e movimentem os corpos espectadores, ele acontece. Nesta perspectiva, aliando as ideias de Ranciére (2009) e Munõz (1996), ocorreria uma partilha do sensível, audível e visível, tendo a emergência da sujeita (re)apresentada como objetivo e, como consequência, a existência da evidência da performance negra trans de Linn da Quebrada. Assim, observando Bixa Travesty, a possibilidade de discussão da potência das políticas de presença negras e trans se faz material, visto que, no documentário, temos, talvez pela primeira vez dentro dos centros de circulação audiovisual brasileira, uma travesti negra atingindo grandes centros de circulação midiática. Por fim, ressaltamos a esperança criada após a ocorrência desta performance, e, claro, a circulação de seu material em arquivo, ansiando pelas diversas materializações das reverberações desta potência energética (re)apresentada. |
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Bibliografia | DRAVET, Florence. Comunicação e circularidade – estudo de comunicação feminina a partir do giro da pombagira. In: DRAVET, F. et al. (orgs.). Pombagira: encantamentos e abjeções. Brasília: Casa das Musas, 2016. p. 95-115. Disponível em: https://www.academia.edu/38625519/POMBAGIRA_encantamentos_e_abje%C3%A7%C3%B5es. Acesso em: 21/11/2020 |