ISBN: 978-65-86495-02-7
Título | Questões públicas no documentário autobiográfico estadunidense recente |
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Autor | Gabriel Kitofi Tonelo |
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Resumo Expandido | Abordarei como a produção recente de documentários autobiográficos nos Estados Unidos apresentam desdobramentos epistemológicos contemporâneos em relação à história de tais filmes no país. Para tanto, proponho uma análise conectada de três documentários lançados nos últimos quatro anos: Strong Island (Yance Ford, 2017), Did you wonder who fired the gun? (Travis Wilkerson, 2017) e Minding the Gap (Bing Liu, 2018). Tais filmes fornecem elementos que refletem e refratam debates sociais e políticos atuais por meio do impulso autobiográficos que imbui tais filmes, da mesma maneira em que se projetam às decisões de construção narrativa pelos cineastas. Narrativas documentárias autobiográficas apontam de diferentes maneiras para a ordem do coletivo, social ou político. A história mundial de tais filmes evidencia que documentários autobiográficos foram um importante vetor de endereçamento de questões públicas e coletivas ao longo das décadas. Ao filmar e compartilhar aspectos de trajetórias individuais, cineastas construíram narrativas que apontavam para questões sociais, políticas e culturais mais amplas em um determinado momento. O impulso autobiográfico, pode-se então considerar, reflete circunstâncias temporais que são contemporâneas à realização dos filmes. Em outras palavras, o desejo de contar uma história pessoal está imbuído de uma experiência social mais ampla relacionada a um tempo presente compartilhado por cineastas e espectadores. Autobiógrafos(as) são movidos(as) pelo pensamento de que a exploração e a exposição de parcelas de sua experiência vivida interseccionam-se à produção cultural de um determinado espaço-tempo, ampliando debates contemporâneos e explorando questões vitais para outras pessoas que compartilham a experiência de viver o mundo em um determinado momento, lugar e circunstância. No caso estadunidense, narrativas documentárias autobiográficas “tocaram” a ordem do coletivo ao, por exemplo, abordar novas configurações de relacionamentos familiares e conjugais em um cenário pós-1968; ao tematizar a experiência de mulheres-cineastas em relação à vida doméstica, questões de saúde pública e à divisão de trabalho, na década de 1970; ao referenciar o temor da bomba atômica em meio à intensificação da corrida armamentista durante a era Reagan, na década de 1980; ao trazer narrativas personalizadas relativas às experiências afro-americanas; às histórias de imigração forçada, refúgio, deslocamento e exílio; como também à experiência da crise do HIV, na década de 1990; ou, mais contemporaneamente, a problematização da crise dos opiáceos. Seguindo a afirmação de Michael Renov de que o discurso autobiográfico “abraça e é flexionado pelo político” (Renov, 2008: 47), meu objetivo é demonstrar como os filmes mencionados oferecem um conhecimento que, a partir de trajetórias individuais, deriva e contribui para o zeitgeist contemporâneo estadunidense em uma era permeada por movimentos como o Black Lives Matter e o #MeToo. Juntos, os filmes levantam questões sobre a falibilidade do sistema judicial nos Estados Unidos e a impunidade dos homens brancos por crimes violentos ao longo das décadas; sobre a branquitude como norma invisível; sobre violência doméstica, tanto física quanto sexual; sobre a masculinidade heterossexual e a proteção entre os homens em círculos sociais. Como tentarei mostrar, dois dos filmes também propõem um movimento de autoavaliação de identidades historicamente opressoras da parte dos cineastas e que aponta para em um desdobramento epistemológico pouco antevisto na história dos documentários autobiográficos nos Estados Unidos. |
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Bibliografia | Aufderheide, Patricia. “Public Intimacy: The Development of First-person documentary”. Afterimage 25 (1): 16-18. 1997. |