ISBN: 978-65-86495-02-7
Título | Cinema pernambucano de ficção científica: uma análise de Carro Rei |
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Autor | Inana Maria Sabino Fernandes da Silva |
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Resumo Expandido | Nos últimos anos, tem crescido a produção do cinema de ficção científica no Brasil, mostrando que a concepção elitista do gênero como necessariamente caro e melhor representativo de países de antiga industrialização está mais do que equivocada (SUPPIA, 2007). Esse movimento está ligado à crescente apropriação dos gêneros fílmicos pelo cinema brasileiro de maneira geral e não apenas restrita à FC. No cinema pernambucano, que tem uma importância considerável na cinematografia nacional, gêneros como a ficção científica começaram a ser mais produzidos por cineastas que até então ainda não tinham se aventurado no gênero, como é o caso de Renata Pinheiro e sua estreia na FC com o seu mais recente longa Carro Rei (2020). A história de Carro Rei se passa no interior de Pernambuco, em Caruaru, onde uma lei impede que carros antigos possam trafegar. Uma insurgência começa a se criar através da transformação de carros antigos para que pareçam novos. Liderados pelo Carro Rei, os envolvidos se tornam ciborgues altamente manipuláveis dispostos a cumprir todas as suas ordens. A apropriação do lixo e da sucata como tecnologia é marca do cinema brasileiro e outras cinematografias periféricas de ficção científica, culminando em uma estética chamada de basurapunk “na qual às populações periféricas, geralmente de origem latina, não resta alternativa senão o uso do lixo como tecnologia, num contexto marcadamente pós-colonial. (SUPPIA, 2017, p. 8)” No filme, é justamente nesse cenário decadente e poluído de um antigo ferro velho desativado que acontece a metareciclagem dos carros que são taxados como lixo quando a lei entra em vigor. A crítica social sempre tão presente no cinema brasileiro contemporâneo, encontra no gênero de ficção científica uma potencialização, devido a características próprias de subgêneros da ficção científica como o cyberpunk: “um poder unido por minorias que se rebelam na camada mais underground da sociedade” (ELIAS, 2009, p. 21). A insurgência contra o sistema, característica dos protagonistas do subgênero cyberpunk, no filme surge como uma aparente “revolução” que supostamente traria justiça para as pessoas mais pobres, mas acaba intensificando a ideia dos humanos como ciborgues totalmente manipuláveis capazes de seguir quaisquer ordens do Carro Rei, através do uso das extensões e das ferramentas tecnológicas. O filme também se encaixa na ideia de lo-fi sci-fi, que compreende filmes de ficção científica com flexibilidade orçamentária, pouco uso de efeitos visuais, voltados mais para o desenvolvimento dos personagens, tecnologias mais analógicas e uma temporalidade estranha de futuro próximo ou presente intensificado (SUPPIA, 2016). Assim como a grande maioria da filmografia brasileira de FC também pode ser considerada sob esse prisma devido ao próprio contexto de produção. O filme aparenta se passar no presente e não deixa claro seu período. Mesmo quando a narrativa e personagens tentam argumentar em relação a alta tecnologia dos carros transformados, através de dispositivos criados para que os carros se comuniquem com as pessoas, a aparência desses dispositivos é simples, recorrendo assim mais à intenção dos aparelhos do que a sua apresentação. Ginway (2005) faz uma análise de como mitos culturais nacionais foram sendo perpetuados na ficção científica brasileira como a associação da mulher à terra, vista no romantismo brasileiro do século XIX (GINWAY, 2005). Uma das personagens, Amora, estudante de agroecologia cujo próprio nome faz referência à natureza, é quem preconiza o embate da natureza versus tecnologia. Entretanto, a diferença dessa associação da terra à mulher, é que no filme a natureza é uma forma de combater o sistema e não apenas um lugar romantizado para exploração, como nos mitos culturais brasileiros. |
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Bibliografia | ELIAS, H. Cyberpunk 2.0: Fiction and contemporary. University of Beira Interior. Covilhã, Portugal. LabCom. 2009. |