ISBN: 978-65-86495-02-7
Título | Corpos que ameaçam: as mulheres no filme O jardim das espumas (1970) |
|
Autor | Carolina de Oliveira Silva |
|
Resumo Expandido | O jardim das espumas (1970) de Luiz Rosemberg Filho, é um filme geralmente associado ao período do Cinema Marginal, valorizado, em grande medida, por conta de seu radicalismo estilístico. Dado como perdido por quase 30 anos, o filme lança um olhar sobre o período da ditadura, encarnando em suas imagens “a brutalidade e o esgarçamento corporal, na dilaceração da carne pela violência da tortura” (RAMOS; 2018, p. 189). Ao encontrar na alegoria uma incursão para o gênero da ficção científica, O jardim das espumas nega uma estrutura linear em favor da fragmentação, resultado de uma montagem que incorpora fragmentos da realidade a partir de materiais que não foram elaborados pelo autor. Desses fragmentos, a figura recorrente de corpos associados a categoria “mulheres” instiga a uma investigação que pretende escrutinar esses corpos, pensando aspectos da como eles ajudam na construção da mise-en-scène. Ao partilharmos a negação da noção de “porta-casacos” descrita por Linda Nicholson em Interpretando o Gênero (2000), identificando o corpo como um cabide no qual se jogam diferentes artefatos culturais relativos à personalidade e ao comportamento, o que reforçaria a ideia de determinismo biológico – a intenção em recorrer a esses corpos, é, justamente, promover o seu entrelaçamento. Para tal entrelaçamento é importante recorrer a história do feminismo brasileiro e sua gestação em torno da resistência das mulheres sob o regime da ditadura, compreendendo, portanto, a situação de um movimento dentro do contexto de um mundo unilateral e dominado pela hegemonia neoliberal, como descreve Cinthia A. Sarti em Feminismo e contexto: lições do caso brasileiro (2001). Nesse encontro, a articulação entre história, corpo e estilo cinematográfico, que reitera a importância de uma análise estética, já há muito aplicada por autores como David Bordwell em Sobre a história do estilo cinematográfico (2013), nos ajuda a erguer uma hipótese sobre as figuras femininas de O jardim das espumas como além de suas representações primeiras e aparentemente dicotômicas entre agência e vitimismo: a hipótese para essas personagens é de que, ao mesmo tempo em que a dominação de seus corpos são o resultado de um controle intenso de um regime capitalista, eles também se convertem em ameaças para esse regime. Parte-se da própria indagação apresentada por uma dessas personagens: por que essa mulher tá sentada aí, falando milhões de coisas, e daí? O corpo explorado em sua dimensão mais violenta, dolorosa e abjeta no filme, prevê desdobramentos a partir de sua exorbitância, completamente alinhada a uma narrativa não-linear, que explicita em imagens as torturas promovidas pelo regime da ditadura no Brasil e que se inscreve na história de um planeta pobre, visitado pelos ricos que se interessam em estabelecer um acordo econômico. Ao tomarmos o corpo como também resultante deste processo histórico, recorremos ao texto Film Bodies: Gender, Genre, and Excess (1991) de Linda Williams. Seu estudo discorre sobre a forma e a função dos excessos – a violência e o sexo, por exemplo – em filmes de gênero como a pornografia, o horror e o melodrama. Apesar de Jardim das espumas não se tratar de um filme de gênero, a história possui uma “particularidade de pensar o momento do cinema no mundo da contracultura”, além de ser “regado a gritos fortes e som lisérgico modulando a poesia” (RAMOS; 2018, p. 189), atribuindo ao corpo um tipo de excesso necessário para a sua própria sobrevivência. Assim, a ideia de propor um entrelaçamento que tome como ponto de partida as mulheres – quem são elas? – para conjugá-las em seus aspectos históricos e estéticos – o que se faz com esses corpos? – em O Jardim das espumas, tem como principal objetivo desenvolver um pensamento aprofundado sobre as figuras femininas, demonstrando, se possível, as suas complexidades conjugadas nas relações de poder. |
|
Bibliografia | BORDWELL, David. Sobre a história do estilo cinematográfico. Campinas, SP: Editora da Unicamp, 2013. |