ISBN: 978-65-86495-02-7
Título | Lésbicas racializadas e o “final feliz” em filmes de amadurecimento |
|
Autor | Camila Macedo Ferreira Mikos |
|
Resumo Expandido | Em texto originalmente publicado em 1980, “Heterossexualidade compulsória e existências lésbica” (2019), Adrienne Rich define o apagamento da existência lésbica nas imagens e narrativas do cinema como uma das muitas formas de impor a heterossexualidade às mulheres, dissipando um imaginário capaz de dar esteio a outras formas de vida e de subjetivação que não a heterossexual. Em artigo mais recente, intitulado “A in/visibilidade lésbica no cinema” (2019), Alessandra Soares Brandão e Ramayana Lira de Souza retomam a problemática da (des)aparição lésbica em filmes através de uma outra chave de compreensão, delineada pelas autoras como um paradoxo da in/visibilidade, isto é: se, por um lado, as imagens da lésbica pouco ou nada aparecem no cinema, por outro, “[...] essa mesma invisibilidade pode ser entendida como a imagem de uma latência ou de uma ausência, a cada instante pronta para ser (de)codificada.” (BRANDÃO; SOUZA, 2019, p. 280). Das inúmeras maneiras possíveis de operar a desaparição das lesbianidades nos filmes - mesmo naqueles em que a aparição lésbica se faz momentaneamente bem definida e delimitada -, talvez a morte trágica, frequentemente decorrente do suicídio, seja a mais reiteradamente utilizada, reforçando um enquadramento de culpa e punição para as imagens da existência lésbica. Por consequência, em especial a partir da década de 1990, embates e reivindicações a respeito de representações mais “positivas” e menos infelizes das lesbianidades têm ecoado e produzido efeitos nas realizações cinematográficas. Assim, a construção de um imaginário de “final feliz” para personagens lésbicas está, em alguma medida, implicada nas dinâmicas de aparição e visibilização das lesbianidades no cinema contemporâneo. Mas se, como afirmam Brandão e Souza, “[...] o regime do visível hoje nos permite um encontro menos raro com as lésbicas no cinema” (2019, p. 284), exigindo-nos, em decorrência, “[...] instrumentos cada vez mais sofisticados para a análise das imagens” (2019, p. 284), faz-se igualmente necessário que possamos nos inquietar diante das imagens de felicidade que acompanham tais encontros, olhando com desconfiança para assunções apressadas de que o abandono de finais trágicos seria de todo capaz de nos oferecer filmes menos marcados pela norma heterossexual. É nesse sentido que este trabalho, derivado de uma pesquisa de doutorado em andamento, mobiliza-se pela pergunta: sob que circunstâncias um futuro feliz desponta no horizonte de jovens protagonistas lésbicas e racializadas em longas-metragens contemporâneos, tais quais os estadunidenses “Você nem imagina” (2020, dir: Alice Wu), “Pária” (2011, dir: Dee Rees) e “Mosquita y Mari” (2012, dir: Aurora Guerrero)? Como os marcadores de gênero, raça e sexualidade se imbricam na constituição de sequencialidades de vida que deem contorno à experiência juvenil vivida pelas personagens nesses filmes? E quais regimes normativos estabelecem determinados objetos como promissores ou não de felicidade em suas trajetórias? Para tanto, recorro à análise da articulação entre códigos narrativos de filmes de amadurecimento (“coming of age”) e de “saída do armário” (“coming out”), tomando as noções de temporalidade normativa (Halberstam, 2005) e de teleologia da felicidade (Ahmed, 2010) como ferramentas a partir das quais se pode mirar as histórias de Ellie Chu (interpretada por Leah Lewis em “Você nem imagina”), Alike (interpretada por Adepero Oduye em “Pária”) e Yolanda (interpretada por Fenessa Pineda em “Mosquita y Mari”). |
|
Bibliografia | AHMED, Sara. The promise of happiness. 1 ed. Durham and London: Duke University Press, 2010. |