ISBN: 978-65-86495-02-7
Título | O “filme estrutural” e o “problema dos três corpos” |
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Autor | Rodrigo Faustini dos Santos |
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Resumo Expandido | Ao propor uma “metahistória” do cinema, Hollis Frampton (2009) a faz cruzar, nominalmente, com uma “metahistória” da matemática, e mesmo com a da astrofísica, ao passar por Kepler e Newton. Nesse texto, sua excêntrica marcação da obsolescência do filme pela chegada do radar apresenta densidade, pois não só o instrumento se relaciona com origens do vídeo e da informática, como também possui relações diretas com disciplinas que, no pós-guerra, postulavam-se enquanto meta-teorias: a cibernética e a teoria da informação. O recurso a cibernética (que chegou a explorar o dispositivo fílmico como máquina de cálculo) torna-se instigante se considerarmos que a disciplina orientou-se a um objetivo isomórfico à certas aspirações (ora utópicas, ora irônicas) do cinema de vanguarda, explícitas na vertente dita “estrutural”: a de modelar e instanciar, por meios técnicos, funções da mente humana e do sistema nervoso (PIAS, 2016). Embora uma leitura como a de Noël Carroll identifique que “artists of this period were deeply impressed by the general cultural interests in such things as generative and transformational grammar, the rise of the computer and the pervasive talk of system analysis” (CARROLL, 1984, p. 105) – acrescentemos a “análise estrutural” – apenas recentemente a cibernética e a teoria da informação foram traçadas enquanto bases de uma “rede discursiva” (e aparato ideológico) interdisciplinar do pós-guerra, como fazem Geoghegam (2012), Hui (2019) e Holl (2002). De pesquisas em telecomunicações e centros militares, tal aparato se estendeu desde Roman Jakobson e Claude Levi-Strauss as querelas ciber-etnográficas de Gregory Bateson e Maya Deren até a estética em Max Bense e Abraham Moles (do qual Paul Sharits era leitor), para então, incluindo o observador através da “ecologia da mente” de Bateson, Maturana e von Foerster, ser absorvida mesmo no pós-estruturalismo (cf. HAYLES, 1991), ao mobilizar heurísticas sobre sistemas abertos, gerativos, metaestáveis – e fora-de-controle. Nessa apresentação, considerar relações (e reações) com tal pensamento informacional e cibernético, dispersas em projetos do filme dito “estrutural”, permite re-enquadrar certas limitações ou reduções que as propostas de P. Adams Sitney (2002), por exemplo, instauram ao tentar agrupar tais filmes a partir de ideais como o minimalismo e purificação do meio, quando filmes de Frampton e George Landow já exibiam estruturas complexas e intermidialidade, rompendo simetria. Desafia-se também a visão de Carroll, que para pontuar uma superação do momento estrutural evoca o suposto pós-estruturalismo de gerações seguintes, elidindo como Paul Sharits, em seus textos, já fazia menção a Derrida, e Frampton, aderente ao abismo de citações que tende ao pós-moderno, recursivamente inclui um filme de Yvonne Rainer (aliada a “desconstrução”, segundo Carroll) em seu ciclo Magellan – enquanto Tony Conrad, nos limites do fogo-amigo, já na década de 1970 compunha críticas ácidas às buscas axiomáticas do filme estrutural. Levantarei, assim, elementos que tornam mais “caótica” a presunção íntegra do compromisso estrutural e purista desses artistas, via exemplos como a inclusão, por Frampton, de um “gerador de números aleatórios” em um dos softwares de vídeo digital que desenvolveu ao fim da vida, direcionado a “entorpecer” o playback da máquina (UHRICH, 2012). Mesmo sistemas inicialmente estáveis, destaca Johnston (2008), tal como três corpos celestes em gravitação, apresentam instabilidades a longo prazo, desafios à razão matemática por conta de interações não-lineares que degradam previsibilidade, e que devido a tal dinâmica são tidos como sistemas caóticos – “geradores de informação”, desviantes e fora-de-equilíbrio. Ao interagir com órbitas outras que a do “corpo [celeste] chamado Linguagem” (FRAMPTON, 2009, p. 169), o filme estrutural amplifica perturbações, localizado num sistema mais excêntrico, ruidoso e gerativo – em circuitos com o vídeo, digital e o cibernético. |
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Bibliografia | CARROLL, N. “Film”. In: TRACHTENBERG, S. The Postmodern Moment. California: Greenwood Press, 1985. |