ISBN: 978-65-86495-02-7
Título | O cineasta e sua gestalt. Contribuições metodológicas para a teoria. |
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Autor | Mannuela Ramos da Costa |
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Resumo Expandido | No mundo da arte, por mais solitária que seja a execução de uma tarefa, muitos outros indivíduos colaboram para que ela ocorra, nos levando à ideia de cadeia produtiva (da produção à circulação), cena e circuito (HERSCHMANN, 2013, p.45), a depender do grau de formalização e rigidez de suas estruturas e relações. Em atividades essencialmente coletivas, como no cinema, essas colaborações tornam-se ainda mais evidentes, das quais derivam igualmente convenções e discordâncias. Para Becker (1999, p.101), é o aprofundamento das relações de colaboração e trabalho conjunto que definem as convenções: formas de fazer, preconcepções e decisões, até arbitrárias, mas que respondem a motivações, afecções e interesses subjetivos, possibilidades e limitações técnicas ou financeiras. O autor (id.) defende que esse mundo da arte é composto por todos cujas atividades são necessárias à realização da obra (incluindo o espectador), e estes atores partilham de valores comuns, manifestados em práticas (rotinas e modos de fazer) e artefatos utilizados regularmente: “as obras artísticas não são produto de indivíduos geniais, muito mais o resultado de um trabalho coletivo de todos aqueles que cooperam através das convenções características de um mundo da arte que permite a existência dessas obras” (BECKER, 1999, p.102). Essencialmente, as metodologias da Teoria de Cineastas sugerem tanto a análise da obra como materialidade de um pensamento, quanto os textos (aqui entendidos em sua variedade de expressões e formas) produzidos por estes cineastas, ambos incluídos no contexto em que se produzem. Como forma de reflexão, sugiro aqui o tratamento dessas instâncias não apenas pelo viés individual, mas de compreender as subjetividades dos cineastas dentro das coletividades em que se forjam e nas quais atuam. Assume-se que o filme é, por natureza, obra coletiva e que entre o argumento e a montagem, diversas metamorfoses acontecem, assim como mediações com as diversas instâncias externas à obra: aspectos econômicos, legislativos e políticos, lidos como instituições que agem diretamente sobre as condições de criação e realização, por meio de suas regras, agentes e fluxo de informações próprios. Coletivos artísticos, selos e produtoras formadas por mais de um cineasta, podem ser entendidos como um grupo mais ou menos estável de cooperação, em que há uma partilha de saberes e crenças, bem como uma colaboração mútua nos trabalhos, intercambiando funções e posições a cada filme. Esse estilo de colaboração já é conhecido e foi intensivamente explorado por diversos estudos (a exemplo do Alumbramento, CE-RJ-MG; Casa de Cinema, RS; Teia, MG; Duas Mariola, RJ; Símio Filmes, RJ; Trincheira Filmes, PE; Filmes a Granel, PB) e conta com depoimentos, cartas, manifestos e filmes, que expressam desejos, motivações e perspectivas artísticas que denotam as convenções adotadas pelos cineastas como um posicionamento coletivo, que congrega uma diversidade de atores, territórios e obras. Acrescente-se que Costa (2017) alertou para o peso da institucionalidade, isto é, instituições, físicas ou abstratas, que tem regras e processos próprios e que condicionam a agência humana, estruturando ou mediando as relações e os objetos que delas resultam. Na realização audiovisual, o sistema de leis, políticas e condições econômicas contingenciam e condicionam as produções (o tamanho das equipes, as escolhas de elenco, de locações e até as narrativas) tão fortemente quanto o ethos estético (MAFFESOLI, 2010) que delas se depreende (observe-se o conjunto de obras de um determinado grupo de cineastas), de uma geração ou movimento político-estético. Pretendo demonstrar, a partir de um conjunto de filmes e entrevistas concedidas a mim por diversos profissionais, como essas instâncias (a coletividade e a institucionalidade) estruturam o pensamento e a obra de cineastas, sugerindo ainda a inclusão de produtores como colaboradores criativos nos filmes independentes em que atuam no contexto contemporâneo. |
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Bibliografia | BECKER, Howard S. Les Mondes de l’art. Trad.: Jeanne Bouniort. Flammarion: Paris, 2010. 380p. |