ISBN: 978-65-86495-02-7
Título | AS SOMBRAS, O CORPO FEMININO E O VOYEUR EM JULIO BRESSANE |
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Autor | Raquel Cristina Ribeiro Pedroso |
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Resumo Expandido | Considerando a produção audiovisual de Julio Bressane, iniciada na década de 1960 e integrada à interpretação do Brasil da segunda metade do século XX aos dias atuais, sabemos que a presença de outras artes como a escultura, a música, a pintura, a fotografia, a literatura e até mesmo a filosofia são traços amplamente percebidos e de instigante apreciação. As imagens de Bressane remetem a um acervo de memórias que espelham a autoconsciência intelectual no audiovisual, e essa composição, ou transcriação, assegura aos filmes a poética autoral característica do que vem a ser o seu cinema de autor. Com efeito, a profícua criação cinematográfica de Bressane poderia ser objeto de longas análises, entretanto, para este trabalho, será evidenciado imagens-chave do longa “A erva do rato”, de 2008, no que diz respeito ao processo de tradução de dois contos de Machado de Assis (“Um esqueleto, 1875” e “A causa secreta, 1896”) que culminam na composição de sombras, de duplos e do corpo feminino como objeto de prazer, por meio do olhar da câmera fotográfica nas mãos do protagonista do filme. A ação do homem, personagem de Selton Mello, denuncia aspectos de crueldade, da busca pelo prazer na manifestação de pulsões humanas e do voyeurismo. Dos escritos de Machado, Bressane recolhe a ironia e revela os alicerces do audiovisual construído pela linguagem ficcional, ou melhor, por uma metalinguagem desnaturalizadora da ficção. E esse ponto de contato entre os autores permite-nos explorar esse filme de Bressane como o esboço de experiências humanas em processo. A fotografia de Walter Carvalho enfatiza os tons sombrios e o ambiente fechado em que se passa a montagem, e a trama que gira em torno da obsessão do homem pela mulher, personagem de Alessandra Negrini, permite que o espectador seja conduzido para dentro da mania e densidade d’Ele. Carvalho ressalta a articulação chiaroscuro, luz e sombra, cores e imagens esteticamente harmônicas, em que o desejo e volúpia aludem à ideia de que os personagens serão, de algum modo, “reduzidos” ao ambiente da casa e às manifestações das pulsões. Nos planos em que as sessões de fotos tomam a cena percebemos a prevalência do duplo por meio de sombras, da luz baixa e do aspecto obscuro que toma espaço na atmosfera da casa e dos personagens, e, inundam a tela do espectador com a sensação de objetivação do corpo em exibicionismo e voyeurismo. Os planos do filme em processo de construção da imagem acabam apresentando a desconstrução do mascaramento do casal, restando a ideia de cumplicidade que, no fundo, é sobreposta ao domínio do outro. Desse modo, sabemos, portanto, que ao se analisar a complexa relação entre amor, desejo e gozo a partir das sombras e dos duplos que deambulam entre as cenas é possível perceber que os elementos transpostos da literatura, da fotografia e de pormenores da montagem agem como articuladores do audiovisual. |
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Bibliografia | BRESSANE, Julio. A erva do rato. [Filme-vídeo]. Roteiro e direção de Julio Bressane. Rio de Janeiro, Brasil, 2008. 1h20 min. color. son. |