ISBN: 978-65-86495-02-7
Título | Buñuel e Torre Nilsson na contramão do "Neorrealismo latino-americano" |
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Autor | Estevão de Pinho Garcia |
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Resumo Expandido | Na historiografia do cinema o Neorrealismo italiano é frequentemente considerado como um movimento situado entre o cinema clássico dos grandes estúdios e os cinemas novos dos anos 1960. Esta específica e particular tendência do cinema italiano do imediato pós-guerra se tornaria o emblema, portanto, de um período de transição entre dois distintos modelos de cinema: um tido como antigo e ultrapassado e outro, necessariamente defendido como novidade. Nessa permanente e contínua batalha entre o “velho” e o “novo” este movimento de transição seria o precursor do cinema moderno que explodiria na década seguinte. A partir desta compreensão teleológica o cinema moderno não poderia haver existido sem o surgimento do Neorrealismo. Compreensão que, de certa forma, é reproduzida pela historiografia clássica do cinema latino-americano em sua abordagem da década de 1950. Esse período é sentido como uma etapa de transição entre o cinema clássico industrial produzido nos estúdios mexicanos, argentinos e brasileiros e o denominado Nuevo Cine Latinoamericano. Para essa historiografia a fase de transição entre o clássico e o moderno seria essencialmente marcada pela incidência do modelo neorrealista em cineastas que ela rapidamente classifica como os “pioneiros” dos cinemas novos de seus países. O brasileiro Nelson Pereira dos Santos, o argentino Fernando Birri e os cubanos Tomás Gutiérrez Alea e Julio García Espinosa, portanto, seriam os “pais” do Nuevo Cine Latinoamericano. Contrariando essa versão oficial da história que limita o Neorrealismo realizado na América Latina aos setores de esquerda, Paranaguá aponta que o movimento também influenciou determinados estúdios e se serviu de modelo, tanto para a absorção como para o rechaço, a outros cineastas. Paranaguá (2003, p.36-39) define os não neorrealistas Luís Buñuel e Leopoldo Torre Nilsson como os dois grandes cineastas da transição entre os velhos estúdios e os cinemas novos da década de 1960. Para exemplificar o seu argumento cita Los olvidados (México, 1950) do primeiro e El secuestrador (Argentina, 1957), do segundo. Os dois filmes abordam a deliquência infanto-juvenil em grandes metrópoles latino-americanas, são filmados em locações, utilizam atores não-profissionais e promovem um contundente retrato social. Para o historiador, os filmes estabelecem diferentes diálogos com o Neorrealismo: o de Buñuel seria tenso e conflitivo enquanto o de Torre Nilsson seria convergente. Los olvidados, apesar de apresentar os elementos básicos da cartilha neorrealista, sairia de seus trilhos por acionar uma abertura para a subjetividade, o imaginário e o onírico. A poética do banal e do cotidiano, própria da corrente italiana, não seria solúvel ao ser colocada no contexto de uma estética permeada por complexos de Édipo, sonhos e desejos insólitos. Em relação a El secuestrador acreditamos que a sua convergência ocorre até um certo ponto uma vez que a concepção de realismo de Torre Nilsson é visivelmente oposta a da escola italiana. O diretor argentino é notoriamente reconhecido por destilar de forma exemplar uma estética do excesso e do transbordante. Até mesmo em El secuestrador não deixará de compor personagens literários, de manobrar certas marcas de estilo (os famosos planos inclinados) e de executar outros procedimentos não realistas a fim de obter os efeitos que deseja produzir. Entretanto, independente do grau de parentesco com os italianos El secuestrador se aproxima de Los olvidados por ser um fato isolado e por não ter feito escola no interior de sua cinematografia. Podemos afirmar que devido à crueldade e ao tom pessimista de suas imagens, esses dois filmes se afastam do humanismo esperançoso dos filmes da dupla Zavattini/ De Sica, tão caros e influentes aos “pioneiros” do Nuevo Cine Latinoamericano. O nosso objetivo é examinar de que forma esses filmes estabeleceram uma tradição que não foi continuada pelo NCL e que acabou neles mesmos. |
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Bibliografia | BUÑUEL, Luís. Escritos de Luis Buñuel. Madrid: Editorial Páginas de Espuma, 2000. |