ISBN: 978-65-86495-02-7
Título | QuilomboCinema : Ficções e encruzilhadas no Cinema Negro Brasileiro C |
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Autor | tatiana a c costa |
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Resumo Expandido | Este trabalho apresenta parte de uma pesquisa em andamento que busca compreender o Cinema Negro Brasileiro no que ele agencia de possibilidades de testemunho e elaboração fabulatória das negruras, suas memórias e pertencimentos. A compreensão dessa a existência com e nas imagens e sons não se dá a partir de um indivíduo ou filme isolado: considero a multiplicidade de sujeitos em interação em campos para além da realização dos filmes, incluindo a pesquisa, a crítica e a curadoria e constituindo um campo/fenômeno que chamo aqui de QuilomboCinema. O conjunto de filmes adotados nesta proposta de investigação vem desse contexto compreendido aqui, também, como um “lugar disruptivo” anunciado por bell hooks (2018) em sua discussão sobre o “olhar opositor”. Para compreender este fenômeno e analisar os filmes gerados neste contexto, tomo para este estudo parâmetros epistemológicos afro-brasileiros, predominantemente Bantu e com algumas aproximações/interseções Nagô. Empreendo uma experimentação com uma metodologia da encruzilhada e trazendo os conceitos de "afrografia" e "tempo espiralar" trabalhadas por Leda Maria Martins (1997 e 2002) em ginga com outras perspectivas decoloniais/contra-coloniais e com aportes teórico-conceituais mais específicos no campo de estudos de Cinema, numa tentativa de dar conta das particularidades raciais - as negruras - das construções simbólicas presentes nas obras. Parto da hipótese de que o Cinema Negro Brasileiro, na contemporaneidade é realizado por e com corpos-ficção num contexto de aquilombamento e numa elaboração de uma experiência negra em sua multiplicidade. A ideia de aquilombamento é articulada com os apontamentos sobre a genealogia do termo Quilombo elaborada por Maria Beatriz Nascimento (2018). Nascimento descreve a trajetória que possibilita a transição do termo Kilombo desde África até seu uso como “instrumento ideológico” e “ficção participativa” no século XX. Essa discussão também aproxima-se do Quilombismo de Abdias do Nascimento (2019). A ideia de corpo-ficção é importante para compreender a dimensão inventada do que nos nomeia como uma outridade e, junto disso, a potência de invenção de si que constitui os sujeitos não-hegemônicos – especificamente, aqui, pessoas negras num país que ainda não se conciliou com seu passado colonial e escravagista. Para compreender a problematização e elaboração da identidade negra com e no Cinema, aproximo Jacques Ranciere (2013) e Achille Mbembe (2018) no que cada um deles articula da ideia de ficção. A noção de encruzilhada é tomada aqui, a partir de Leda Maria Martins (1997) como um “lugar radial”, “operadora de linguagens e discursos”. O movimento da/na encruzilhada nos possibilita compreender os filmes no que eles concentram e dispersam desse pensamento aquilombado. Os filmes, que chamo aqui de radiais, condensam, cada um a sua maneira, questões que me parecem centrais para esta pesquisa, sobretudo no que apresentam de possibilidades de articulações de uma epistemologia preta que podem colaborar para a observação de outros filmes no contexto do fenômeno CinemaQuilombo. Entre as questões estão: a temporalidade espiralar (MARTINS, 1997) articulada em Travessia (Safira Moreira, 2017); a espacialidade negra nas discussões sobre encruzilhada (MARTINS, 1997) e geografias negras / black geographies (MCKITTRICK, 2010) presentes na topografia constitutiva da estrutura de noireBLUE (Ana Pi, 2018); a figuração da “dupla consciência” dos sujeitos negros diaspóricos (W. E.B. Dubois apud GILROY, 2012) realizada em República (Grace Passô, 2020); e articulações mais diretamente relacionadas às cosmogonias africanas e afrodiaspóricas aplicadas às formas fílmicas, como a estrutura-oriqui de Pattaki (Everlane Moraes, 2019). No movimento próprio da encruzilhada, as questões se fazem presentes em atravessamentos e sobreposições, se espraiando nos curtas deste pequeno conjunto. |
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Bibliografia | GILROY, P.. O Atlântico negro: modernidade e dupla consciência. São Paulo: Editora 34; Rio de Janeiro: Universidade Cândido Mendes, Centro de Estudos Afro-Asiáticos, 2012. |