ISBN: 978-65-86495-02-7
Título | O fantasma palpável no cinema de Kiyoshi Kurosawa |
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Autor | Natália Mendes Maia |
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Resumo Expandido | No livro Mon Effroyable Histoire du Cinéma, o realizador japonês Kiyoshi Kurosawa (2008) fala sobre o “fantasma palpável”, uma forma objetiva que mostrar que o fantasma existe no quadro. “Eu acredito que aquilo que aparece em um filme existe, aquilo que não se mostra, não existe. Se um fantasma está na tela, ele existe” (Ibidem, p. 24, tradução nossa). Até 2021, Kiyoshi Kurosawa assinou 50 trabalhos como diretor, transitando entre diversos gêneros cinematográficos: pinku eiga, yakuza, ação, horror, ficção científica, romance, drama. Mesmo numa cinematografia tão múltipla, parece existir uma constância no seu interesse por olhar elementos forasteiros que causam estranhamento e tiram seus personagens e nós mesmos, como espectadores, de uma posição de conforto. Em entrevista concedida à revista Reverse Shot, ele fala que “através da injeção de um elemento estrangeiro na vida dos personagens, eles começam a ver suas vidas de forma diferente e reavaliar suas realidades. Esse é, de forma geral, o horror que mantém meus filmes unidos” (tradução nossa). Os fantasmas encarnam, em muitos de seus filmes, esse elemento fantástico que modifica a encenação. Nossa comunicação é focada no estudo da presença dos fantasmas nos filmes Loft (Rofuto, 2005) e Retribution (Sakebi, 2006), realizados no contexto do J-Horror, movimento que marcou as novas tendências do gênero do horror no Japão do final dos anos 1990 até a primeira década dos anos 2000, com obras que foram amplamente adaptadas como remakes (refilmagens) na indústria cinematográfica norte-americana (LOPERA, 2016). Analisaremos os elementos formais e narrativos da mise en scène nos planos, cenas e sequências em que os fantasmas aparecem nesses filmes. Ao falar sobre o conceito de presença, Gumbrecht (2010) invoca um desejo de ultrapassar um mundo cotidiano amplamente cartesiano e historicamente específico. Erick Felinto (2008) expressa o desejo do fantasma se comunicar conosco. “Como o cinema de horror demonstra claramente, ela provoca arrepios, sensações, prazeres físicos ou mal-estar – é material, ao mesmo tempo que imaterial. (Ibidem, 2008. p.129) Nos interessa também aprofundar o pensamento sobre os fantasmas a partir do “realismo fantasmagórico”, (MELLO, 2015), uma designação que nasce do desejo de aliar o realismo baziniano com a imaginação, medo e mitos presentes em algumas produções do cinema contemporâneo do leste asiático. Como nos dizem Fernando Guerreiro e José Bértolo (2019), os fantasmas de Kurosawa são aparições corporalizadas de uma reivindicação da vida pela morte. Na entrevista à Reverse Shot, Kurosawa também afirmou que, para ele, os fantasmas do cinema japonês são muito mais assustadores do que os fantasmas do tradicional horror americano, pois quando um fantasma ataca violentamente ou vai atrás de você, há uma chance de lutar contra ele. E o que você está lutando é pela ideia de que você pode vencer o mal e voltar à sua vida normal, um maniqueísmo que simplifica as relações. Mas se eles não atacam, e só se pode coexistir com eles. “Eu acho a ideia de viver com isso muito mais assustadora. Você não tem chance de fugir ou combater esse fantasma, você está preso a ele para sempre”. As presenças de Kurosawa deslocam seus corpos nas sombras, modificam o quadro e exigem que nos comuniquemos. Aqui, não precisamos nos preocupar o excesso de luz. Na sociedade ocidental contemporânea que postula um projeto negacionaista diante da morte e dos mortos, Kurosawa nos convoca a nos aproximarmos das sombras e deixarmos que elas também nos habitem. |
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Bibliografia | DU MESNILDOT, Stéphane. Fantômes du Cinema Japonais – Les Métamorphoses de Sadako. France: Rouge Profond, collection Raccords, 2011. |