ISBN: 978-65-86495-02-7
Título | Imagens em disputa no documentário brasileiro contemporâneo |
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Autor | Cristiane Freitas Gutfreind |
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Resumo Expandido | Essa proposta pretende analisar as imagens em disputa nos documentários brasileiros contemporâneos com o objetivo de construir uma escrita da história por meio de escolhas estéticas que configuram uma narrativa sobre o político. Faz-se importante ressaltar as especificidades do atual contexto histórico, considerando a herança da ditadura civil-militar em seus aspectos, transportados para as telas, que dizem respeito a liberdade de expressão, ao uso indevido da força para cercear direitos individuais, a manipulação das mídias, a militância, bem como a dor física e social que deixou suas consequências no imaginário contemporâneo. Segundo Aarão Reis (2014), a cultura autoritária reatualizada, no período subsequente a ditadura, reforçou as diferenças econômicas, políticas e sociais. Além disso, desde o golpe parlamentar, em 2016, e a eleição presidencial, em 2018, “alcançou a superfície um movimento que vivia no recato” (SCHWARCZ, 2019, p.217), ou seja, instaurou-se uma intolerância deliberada às diferenças de crença, gênero e raça, a orientação sexual e aos posicionamentos políticos. Acrescenta-se, ainda, o perturbador fascínio de parte da população que clama nas ruas pelo retorno da ditadura militar, a exaltação de torturadores por parte do presidente eleito e a militarização do primeiro escalão do governo. O ódio passou a ser autorizado e “o capitalismo autoritário, cuja hegemonia fora desafiada ainda que timidamente” (SOARES, 2019, p.219) nos últimos anos, retorna a ordem da vez. Essa proposta pretende analisar como os diversos registros imagéticos, as estratégias estéticas e de estilo dos documentários contemporâneos, tais como O Processo (Maria Augusta Ramos, 2018), Democracia em Vertigem (Petra Costa, 2019) e #eagoraoque (Jean-Claude Bernardet e Rubens Rewald, 2020) inferem na questão política e histórica. As situações traumáticas geram transformações importantes nas formas de representação nas artes em geral, e, particularmente no cinema, devido ao seu papel fundamental como testemunho (KRACAUER, 1997), participando da construção do conhecimento, da visibilidade do subjetivo e das articulações na dimensão do político. Esses documentários evocam personagens cuja existência é legitimada pela história ou pela atualidade; sua forma é híbrida por excelência e transita entre o filme político, o filme testemunho, o filme de família, o filme diário, o filme reportagem, o filme histórico e, também, o filme militante. Esse último teve grande repercussão entre os anos 30 e 80 e o seu declínio acompanhou o esmaecimento do engajamento político e social naquele período. No entanto, seu retorno pode ser observado a partir das manifestações da Primavera Árabe que acabaram replicadas pelo mundo todo. Hoje, o filme militante, inscrito em uma causa política, social e ideológica, retorna como forma de revelar um acontecimento marcado por uma situação de injustiça. Assim, os filmes desse trabalho propõem uma discussão entre imagens do passado e do presente com o intuito de revelar a violência social por meio da “renúncia progressista da história” (BADIOU, 2015, p.55). Contempla, ainda, um esforço memorialístico e indaga sobre as articulações entre situações, a subjetivação do sujeito e do seu espaço social. Essa experiência narrativa torna-se o lugar onde se trava uma constante oposição da ordem da subjetividade entre o “fazer viver” e o “deixar morrer”, simetria que divide as relações de poder. Agamben parte, justamente, dessa fórmula simétrica, em O que resta de Auschwitz (2008), para propor uma terceira fórmula - “fazer sobreviver” -, como tarefa fundamental das relações de poder, no nosso tempo, que não se divide em viver e morrer, mas em uma sobrevivência infinita, em uma separação entre o ser vivo e o ser que dá visibilidade a história. Essas imagens não garantem a verdade factual, mas a necessidade de revisitar a história-política diante do esquecimento e do au |
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Bibliografia | AARÃO REIS, Daniel. Ditadura e Democracia no Brasil. Rio de Janeiro: Zahar, 2014. |