ISBN: 978-65-86495-02-7
Título | Karim Aïnouz e o(a) pesquisador(a) na T. de C.: outras aproximações |
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Autor | Marcelo Carvalho da Silva |
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Resumo Expandido | Esta proposta busca investigar algumas relações entre o(a) pesquisador(a) e a obra cinematográfica (como objeto de investigação) no âmbito da Teoria de Cineastas. Para tanto, faremos uso de uma pesquisa em curso que tem como fonte primordial os filmes e as entrevistas de Karim Aïnouz. O objetivo é pensar os deslocamentos espaciais e as divagações mentais em seus filmes, além de propor um campo conceitual preliminar apropriado à obra deste cineasta. Os filmes de Karim Aïnouz compõem realidades afetadas por movimentos diversos – perambulações, viagens, fugas, migrações etc. Mas, em boa parte das vezes, os deslocamentos são deixados de fora do filme, ocultados por elipses. Em uma entrevista sobre o filme Praia do Futuro, Aïnouz assinala sua opção pela elipse: “Ele [o bombeiro Donato] atravessa o Atlântico, ele mergulha [em uma praia da cidade de Fortaleza] e sai em Berlim, para começar de novo. (...) Importa a travessia para outro lugar para ser outra pessoa. Esse é o lado mais metafórico do filme” (AÏNOUZ, 2014a). Em Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo, em Diego Velázquez ou Le Réalisme Sauvage e em Seams a viagem perde importância em prol de puras divagações mentais. Dos três filmes, Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo é o único onde um grande deslocamento é mostrado. O filme é todo narrado em off por um geólogo que viaja pelo interior do país para fazer o levantamento do solo por onde passará um canal de irrigação. As imagens da paisagem árida do Nordeste brasileiro são intercaladas com descrições objetivas e referências extemporâneas à companheira. Até que o narrador revela que a mulher o abandonou e a partir desta revelação o relato torna-se completamente confessional e divagante. A viagem perde o sentido, a perambulação toma a vez do grande deslocamento geográfico e as imagens entram em uma lógica de desconexão. Diego Velázquez ou Le Réalisme Sauvage narra uma viagem em busca dos caminhos percorridos pelo pintor por meio de suas pinturas. Também aqui há um narrador que relata o percurso e que não aparece no filme. De tempos em tempos, o narrador deixa escapar comentários divagantes e desconexos sobre a perda de um amor. Seams, novamente um filme onde o narrador transita entre o relato objetivo e a confissão, elide materialmente a viagem, mas é para a grande fuga que o filme se dirige. Trata-se de um relato sobre as tias de Aïnouz, sua difícil relação com os homens e com o machismo da cultura local. A condição social das mulheres faz com que tenham uma vida sedentária, mas Aïnouz termina o filme dando uma pista de sua própria saída daquele ambiente. Gostaríamos de finalizar esta proposta com duas figuras conceituais, criadas para os deslocamentos espaciais e as derivas mentais que identificamos nos filmes do cineasta. A primeira é o redemoinho, que definiria os movimentos convulsos que não progridem, mas que revolvem o terreno e cavam sob si um nicho que é ao mesmo tempo proteção e prisão: são as tias de Seams e sua luta surda contra o machismo, e também o amor perdido do narrador de Diego Velázquez ou Le Réalisme Sauvage. A outra figura é a linha. Em Viajo Porque Preciso, Volto Porque Te Amo, o geólogo cruza o país executando seu trabalho de maneira objetiva em um deslocamento em linha reta (que se quebra após a revelação de que sua companheira o abandonou, fazendo-o entrar em um redemoinho emocional). Em Diego Velázquez ou Le Réalisme Sauvage é a viagem presumível (a linha oculta), um mergulho nas pinturas de Velázquez que toma o lugar de um deslocamento espacial que recuperaria os passos do pintor. Mas também aqui a linha é regularmente quebrada por pequenos redemoinhos causados pelas lembranças da relação amorosa desfeita. Por fim, a emblemática música dançante já nos créditos de Seams que confirma um deslocamento passado não exibido pelo filme: a linha que se projeta, o salto do próprio Karim Aïnouz em direção à libertação sexual: “Mais do que se encontrar, me interessava mais o salto” (AÏNOUZ, 2014a). |
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Bibliografia | AÏNOUZ, Karim. Entrevista: Os Deslocamentos e as Perturbações no Cinema de Karim Aïnouz. Entrevista concedida a Gabriel Carneiro. Revista de Cinema, 14 de maio de 2014. |