ISBN: 978-65-86495-05-8
Título | Ensaísmo, subalternização e subjetivação política no cinema periférico |
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Autor | Camilla Vidal Shinoda |
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Resumo Expandido | O artigo proposto tem como objeto analisar o processo de subjetivação política (RANCIÈRE, 2014) no curta “História de Ceilândia contada por pioneiros” (2021), de Gu da Cei, filme que elabora uma contra-argumentação à versão oficial da história de Brasília e Ceilândia. Gu é um cineasta nascido na Ceilândia, região administrativa (RA) do Distrito Federal originada a partir da expulsão dos pioneiros - aqueles que construíram a Capital do país - para o local distante que herdou em seu nome as iniciais da sigla da Campanha de Erradicação de Invasões (CEI). A subjetivação política é um processo de desidentificação com um comum que está posto (RANCIÈRE, 2014, p.71) e isto acontece no filme de Gu a partir de dois movimentos principais: a construção de uma subjetividade periférica autora da contra-argumentação e a emergência das subjetividades dos pioneiros do material de arquivo que é matéria-prima do filme. Caracterizar o documentário como um ensaio fílmico, a partir do conceito elaborado por Mateus Araújo (2013), é importante para descortinar o eu periférico que conduz a argumentação. Segundo Araújo, um ensaio fílmico possui uma organização argumentativa dos fluxos de imagem e som e a presença de um sujeito mediador da elaboração desse pensamento dentro da obra. Considerar essas duas premissas na análise fílmica ajudará a identificar esse sujeito periférico que não se revela em uma primeira pessoa, mas sim na condução do fluxo das imagens e sons que estruturam o pensamento desenvolvido pela obra. O segundo movimento busca compreender como esse sujeito periférico mergulha nos arquivos oficiais e reencontra as subjetividades dos pioneiros, personagens subalternizados (SPIVAK, 2010) nessa versão da história. O documentário é realizado a partir do acervo do “Programa História Oral” do Arquivo Público do Distrito Federal (ArPDF). Para análise do manejo fílmico desse material, dialogaremos com a compreensão de que os arquivos não são repositórios de fatos, mas que eles podem ser lidos e interpretados, como defende Spivak (1985, p. 248). Assim, será possível compreender como a montagem denuncia a plasticidade hegemônica (SPIVAK, 2010) presente na leitura oficial do acervo público. O uso recorrente da expressão “invasão” para nomear a Vila do IAPI (primeira morada dos pioneiros) e a insistente tentativa de reafirmar Brasília como a capital do futuro são alguns dos elementos presentes nos relatos que confirmam a versão oficial da história. Há, no entanto, momentos em que os pioneiros reconhecem o seu próprio protagonismo na construção da cidade ou que denunciam as condições precárias presentes no processo de expulsão. A montagem do filme reconhece e pincela esses lampejos transgressores, transformando-os no motor propulsor da camada sonora do documentário. A camada imagética – também constituída de material do acervo do ArPDF – potencializa o ato transgressor, por meio de enquadramentos, movimentos de câmera e pelo próprio simbolismo das imagens que compõem o plano. O documentário faz emergir as subjetividades dos pioneiros, que haviam sido expulsas da história oficial. Este artigo evidencia, por fim, o diálogo entre pioneiros e o sujeito periférico que conduz o argumento, isto é, duas subjetividades subalternizadas que se reconhecem e elaboram juntos uma outra versão da história. Essas subjetividades subalternizadas são as autoras desse pensamento, outro ato transgressor proposto pelo documentário ensaístico. Por meio desse conjunto de atos transgressores, o filme produz uma desidentificação (RANCIÈRE, 2014) em relação à versão oficial da história dos dois territórios do Distrito Federal. Dessa forma, além de propor uma outra relação com arquivos, que permite a elaboração de uma contra-argumentação ao discurso oficial, protagonizada pelas subjetividades até então subalternizadas, o filme se entende também enquanto um modo de subjetivação política, pois permite a atualização da igualdade entre Brasília e Ceilândia. |
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Bibliografia | ADORNO, Theodor. O ensaio como forma [1958]. In: Notas de Literatura I. Trad. e apresentação de Jorge de Almeida. São Paulo: Livraria Duas Cidades / Ed. 34, 2003. p. 15-45. |