ISBN: 978-65-86495-05-8
Título | Fome de amor e as escritas da direção de arte |
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Autor | Benedito Ferreira dos Santos Neto |
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Resumo Expandido | Em 1968, Luiz Carlos Ripper repete a parceria com Nelson Pereira dos Santos e é creditado como diretor de arte em Fome de Amor (1968), cujo roteiro é baseado no livro História para se ouvir de noite, de Guilherme Figueiredo, e assinado pelo próprio diretor em parceria com Ripper. Tal configuração de trabalho, conduzida pela aproximação entre direção de arte e roteiro, recupera sobremaneira estratégias adotadas na construção da imagem crítica de El Justicero, filme anterior de Nelson em parceria com Ripper (SANTOS NETO, 2019). A narrativa está centrada na relação de um casal de brasileiros que vive em Nova Iorque e decide voltar ao Brasil para morar numa praia do litoral do Rio de Janeiro. Ela avança a partir da descoberta de que outro casal habita aquele local. Interessado pelas práticas de encenação, por objetos de cena capazes de ampliar o sentido dos ambientes e o contraste dos figurinos, a direção de arte atua de modo a privilegiar nas imagens em preto e branco o brilho da água do mar e a intromissão da luz solar nos ambientes domésticos combinados com as vestes de banho. Assim, a direção de arte escreve e guia as cenas em ordem não cronológica, dispondo um conjunto de elementos que se mantêm próximos, invisíveis e apartados da imagem, o que contribui significativamente para a transformação do melodrama num filme político. É evidente que a construção de cena necessita da atuação obstinada da direção de arte e da maleabilidade na articulação da relação entre paisagem, decoração de cena e enquadramento. O crítico Ely Azeredo (1968) aponta as “raízes godardianas, resnaisianas, fellinianas” de Fome de Amor e identifica como fundamentais para a plasticidade do filme “(...) a fotografia de Dib Lutfi, os cuidados (com apoio de Luiz Carlos Ripper) cenográficos, de decorações e costumes”. Enquanto a narrativa demonstra interesse pela intimidade dos personagens, que ora se engalfinham, ora se reconciliam — as vicissitudes da vida conjugal —, as imagens exploram a geografia da ilha na tentativa de restituir a riqueza da espacialidade frente ao drama burguês de seus quatro habitantes. A harmonia enquadrada e a transdisciplinaridade comum à prática da paisagem no cinema (e na pintura) (CAUQUELIN, 2008) determinam a reescrita da imagem em Fome de Amor — zona de atuação que requer uma direção de arte inventiva, da escrita da imagem, marca que define o trabalho de Ripper nos anos seguintes. A parceria entre diretor e diretor de arte, inovadora para o período em que o filme foi realizado, e a relação que se estabelece na coautoria de roteiro, revela uma escrita da direção de arte capaz de extrapolar suas fronteiras de atuação. Tal atenção implica o desenho de uma autoria da direção de arte (por que não?) aninhada pelo cinema moderno e ainda pelas aproximações que Ripper celebra com as artes da cena. |
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Bibliografia | AZEREDO, Ely. Memória.BN. Cotações JB, 1968. Disponível em: http://memoria.bn.br/docreader/DocReader.aspx?bib=030015_08&pagfis=116986. Acesso em: 12 maio 2022. |