ISBN: 978-65-86495-05-8
Título | Nos dilemas da visão: o papel da direção de arte na construção da visu |
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Autor | Elizabeth Motta Jacob |
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Resumo Expandido | Um cinema que fala do humano em tempos tão desumanos é o que interessa a Naomi Kawase. Esta cineasta tematiza em suas obras a perda daquilo que é essencial, o papel desestruturante deste acontecimento e as transformações subjetivas à partir daí engendradas. Neste artigo nos interessa analisar o agenciamento dado pelos elementos expressivos da direção de arte na construção de uma imagem háptica no filme Esplendor de 2017. Neste filme acompanhamos o trabalho de uma transcritora de filmes para cegos que apresenta o andamento do mesmo para um grupo do qual faz parte Nakamori. Ele, um fotografo renomado, enfrenta a perda do que lhe permite se inserir e se relacionar com o mundo: a visão. O filme avança utilizando frequentemente um discurso metalinguístico dimensões profundas do ver e do dar a ver. Para este fim Kawase aciona a câmera subjetiva que revela a visão do personagem, aproxima a câmera da superfície das coisas até que elas percam totalmente a nitidez buscando com isso a tangibilidade das coisas e transportando o espectador para o mundo da sensação. Esta proximidade do olhar faz aflorar o sentido do tato, constrói a superposição de estímulos visuais e hápticos apontando para novas dimensões do ver (GONÇALVES, 2012). Através da câmera subjetiva e dos ajustes de enquadramento que simulam o esforço do personagem para focar, o espectador entra em contato com a perda da visão vivenciada por Nakomori, Instaura-se uma nova forma de visualidade onde as texturas se tornam dominantes e a visualidade se torna háptica (MARKS, 2002). Mas para que este processo se dê de forma efetiva e vigorosa percebemos o rigoroso trabalho da direção de arte. A narrativa se dá num jogo de luz e escuridão e o agenciamento dos objetos e da palheta cromática propostos pela direção de arte são centrais para produção dos efeitos desejados. Nas cenas externas há três tipos de situação: Nas cenas diurnas a cidade é movimentada e tonalidades de cinza azulado dominam. Muitas são as tomadas de céus e nuvens descritas por Masako e que fazem uma ponte para as imagens que revelam o campo. O terceiro tipo de cenas externas são as noturnas ou as noites metafóricas da visão de Nakamori, nestas detalhes e texturas dominam. A câmera fica tão próxima do objeto que nem conseguimos identifica-lo, percebemos suas texturas e nos aproximamos mais de sua materialidade do que de uma forma, não percebemos sua integralidade, mas somos absorvidos pelo desejo de toca-lo. Os figurinos são simples e a palheta de cor é reduzida. Masako usa cores claras enquanto Nakamori vai reduzindo seu figurino ao preto metaforizando a noite que está a lhe rondar. Tal procedimento além de estabelecer um diálogo cromático entre os dois metaforiza o negro que que dominará seu campo visual. Nas cenas internas as paredes são brancas e muitos são os detalhes em preto. Poucos elementos adornam os ambientes de trabalho de Misako centrando nossa atenção nos rostos ou nas cenas audiotranscritas. A casa do fotografo é branca repleta de fotografias em preto e branco. As imagens produzidas pelo fotografo são extratos da realidade que ganham materialidade. Os enquadramentos propostos por Kawase reforçam a fragilidade da visão do personagem e apontam, de um lado para os perigos gerados pela cegueira, e por outro para o agenciamento de um olhar táctil compatível com a nova realidade do personagem. Para reforçar esta ideia vemos um prisma que reflete a luz na parede, mas que, na medida que o processo de aceitação subjetiva da cegueira vai se dando, passa a refleti-la no rosto e nos olhos de Nakamori metaforizando a luz que existe além da visão. Uma câmera analógica ocupa lugar central na casa e aponta para a essência do ato fotográfico. Ela é ainda um eixo de articulação entre diversas temporalidades que o filme enseja e a metalinguagem que oferece ao público. Kawase vem, mais uma vez, nos alertar que a memória se apresenta consolidada em materialidades sensíveis em cada objeto e em cada gesto que funda a essê |
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Bibliografia | BARKER, J.. The Tactile Eye. Touch and the cinematic experience.Berkeley and Los Angeles: University of California Press, 2009. |