ISBN: 978-65-86495-05-8
Título | O trato de filmagem |
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Autor | Matheus José Pessoa de Andrade |
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Resumo Expandido | A câmera é uma tecnologia de produção de informação. Parto, assim, da compreensão de que cada uma das formas como a informação é codificada nas sociedades proporciona modos de associação humana, levando as pessoas a maneiras de se relacionarem entre si em função do movimento da informação (MCLUHAN, 2005). No meio cinematográfico, aponto minha objetiva para o efeito de sociabilidade inscrito no ato de gravação com uma câmera, o qual denomino como sendo um trato de filmagem. Ele consiste nos mais diversos tipos de relacionamento que ocorrem entre os usuários da máquina filmadora em cada circunstância de seu uso. Descrevo, assim, um fenômeno de acordos e desacordos existentes entre quem filma e quem é filmado naturalizado dentro do processo de feitura das imagens e dos sons, cuja ação das pessoas se alinham com os valores e condutas próprios do jogo informativo existente no ambiente do cinema. Não me refiro exatamente a um contrato, até porque nem sempre é um processo previsível e tão estável assim. É um tipo de trato estabelecido para tal. Ele influencia o procedimento por inteiro, da criação do modo como se executa a gravação, com que equipamento, de qual maneira a câmera será manuseada nas circunstâncias dadas e, especialmente, no comportamento das pessoas que ali se relacionam na filmagem, como, por exemplo, nos usos do drone (CHAMAYOU, 2015). Destaco, ainda, sua influência também sobre a escolha elementos plásticos da imagem (AUMONT, 2012). Os participantes assumem, assim, os princípios morais e éticos que atravessam o fazer imagético, induzindo os usuários a se comportarem (ou não) por detrás e diante da câmera. Consiste, ainda, em um conjunto de gestos e ações que acontecem no devir das filmagens, os quais tomam rumos inesperados pela forma como o trato se desenrola ao longo do processo de fabricação da informação fílmica até chegar ao seu fim. Numa observação a respeito de parte da obra de Jean Rouch, noto que os processos interpessoais são perceptíveis nas filmagens, as quais demonstram o agenciamento dos seus personagens esborrando no quadro cinematográfico, pontualmente pelos procedimentos inventivos dos rituais de encontro daquelas gravações como fator narrativo. Como observa Marco Antônio Gonçalves (2008, p. 119) a respeito de Rouch, “[...] a câmera é um objeto que cria uma relação entre quem filma e o que é filmado”. Vale destacar, portanto, que os tratos de filmagem de Rouch são singulares quando comparados aos mais recorrentes formatos vistos nas narrativas documentais e ficcionais. Há uma subversão aos códigos capaz de explicitar as relações humanas ali fincadas em função da construção da informação fílmica. Ressalto que o relacionamento entre usuários da câmera acontece em qualquer obra audiovisual, embora não pareça visível em alguns estilos mais corriqueiros. Afinal, nessa perspectiva, todas as filmagens são constitutivas de um trato, seja qual for o grau de consentimento. Estas relações estão atravessadas por um jogo de forças entre os participantes da filmagem, existente dentro das dinâmicas de produção da informação com a máquina filmadora. Isso também se aplica às filmagens das coisas do mundo, as quais estão substancialmente emaranhadas nas relações sociais, ligadas aos valores culturais e patrimoniais dos povos (INGOLD, 2012). Refiro-me, portanto, a todos os tipos de consenso entre os usuários feitos para cada ação de registro. A partir de depoimentos de profissionais do cinema, análise fílmicas e críticas cinematográficas sobre algumas obras, reúno um conjunto disperso de dados para uma amostragem desse fenômeno de sociabilidade inerente às filmagens. São processos que vão desde as encenações preestabelecidas com atores para as obras de ficção, até os conflitos pessoais que ora ocorrem nos documentários. |
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Bibliografia | AUMONT, Jacques. A imagem. 16ed. Campinas: Papirus, 2012. |