ISBN: 978-65-86495-05-8
Título | Epifanias e outras revelações |
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Autor | Luiz Antonio Mousinho |
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Resumo Expandido | O tema da epifania e sua expressão em discurso cinematográfico será observado nos curtas-metragens 14º arrondissement (Paris te amo, 2007), dirigido por Alexander Payne; 3 minutos (1999), dirigido por Ana Luíza Azevedo e no longa Arábia (2017), de Affonso Uchôa e João Dumans. Daremos especial atenção aos momentos epifânicos que se relacionam com as representações das questões familiares e amorosas. Dentre as categorias adotadas na abordagem dos textos fílmicos, mobilizaremos os conceitos de focalização e personagem (GAUDREAULT, JOST, 2009; GENETTE, 2017; BURGOYNE, 1992; SALES GOMES, 1992) bem como as noções de dialogismo e entonação, trazidas da teoria/análise bakhtiniana do discurso (BAKHTIN, 2019, STAM, 1992). Perceber como a linguagem cinematográfica vai lidando com as noções de estranho e familiar (FREUD, 1987) será uma das maneiras de buscar a operação da epifania nas obras, ao nível da diegese, do discurso e das relações com a série social (SHOHAT; STAM, 2006). O sentido etimológico da palavra epifania guarda sua origem religiosa, significando aparição ou manifestação divina. Haroldo de Campos (1979, 12-13) assinala que o termo encontra o seu "rebatismo e prestígio modernos" na estética joyceana e Tomaz Tadeu (2019, p.114) destaca o uso da expressão por James Joyce “para se referir a eventos banais, mas revelatórios”. Para Olga de Sá (1979, p.106). a epifania "é a expressão de um momento excepcional, em que se rasga para alguém a casca do cotidiano, que é rotina, mecanicismo e vazio" No curta-metragem 14º arrondissement, de Alexander Payne, incluído em Paris te amo, a aluna Carol, uma mulher estadunidense de meia-idade, lê (em voz over) redação escolar de um curso de francês, tendo como trilha musical uma bossa-nova padronizada, o ritmo brasileiro afastado dos ruídos criativos de sua aparição inaugural. A personagem se propõe a narrar um dia especial numa viagem a Paris e aos poucos vai revelando suas expectativas em relação à cidade, numa ansiedade abafada entre apresentação de clichês turísticos e aflita necessidade de dotação de sentidos para a viagem e para sua vida. O momento especial ao qual Carol alude no início da redação escolar irromperá na cena final quando ela vai sendo tomada por um sentimento indefinível, como se fosse algo de que não conhecia, mas que estava esperando; algo que não sabia o que era, mas ao mesmo tempo parecia algo esquecido. O estranho, como assinala Freud, é justamente algo conhecido e familiar que foi esquecido. Em Arábia vemos um operário acompanhado em sua vida errante pelo mundo do trabalho, em seus afetos no mundo da amizade e na teia de uma relação amorosa mais marcante; ao mesmo tempo no ambiente extenuante dos empregos precários e da solidão desterrada entre um trabalho e outro. A dotação de sentidos vem da escrita de um diário apresentado em voz over, que vai desvelando o mundo íntimo do personagem, traduzindo momentos de escape, de alcance do delicado da vida, e a falta de sentidos apreendida no mundo reificado do trabalho, nas privações e deslocamentos impostos pela pobreza, até o momento em que uma epifania assoma, ressaltando o absurdo da exploração do trabalho e da vida reificada. No curta 3 minutos, de Ana Luíza Azevedo, o ambiente familiar desenhado no espaço narrativo se transmuta em estranho. O cosmos familiar se transforma em caos (ELIADE, 1992), pela perda de sentidos instaurada por um acontecimento banal que faz a personagem rever sua trajetória conjugal, na urgência temporal onde tempo da história e do discurso coincidem; minutos onde a voz over traz uma vida inteira e a dor do abrir mão de outras vidas possíveis ante a prisão doméstica, a qual a personagem retorna após sua experiência epifânica nauseada. Observaremos nas obras referidas as soluções estético-narrativas de desnaturalização (BARTHES, s/d) dos processos sociais. Em diálogo com os filmes tentaremos pensar também a cultura como armadilha e ainda mais como mapa de possibilidades de libertação. |
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Bibliografia | BAKHTIN, Mikhail. Os gêneros do discurso. Trad. Paulo Bezerra. São Paulo: Editora 34, 2019. |