ISBN: 978-65-86495-05-8
Título | Animação na reconstrução da memória política brasileira |
|
Autor | Jennifer Jane Serra |
|
Coautor | Rosana de Lima Soares |
|
Resumo Expandido | Este estudo tem como objetivo refletir sobre o uso crescente de imagens animadas na representação de memórias de eventos políticos em países latino-americanos, especialmente Brasil, Argentina e Chile. Parte-se da percepção de uma recorrência de filmes recentes que trabalham a memória como um meio de acesso ao passado e trazem uma abordagem subjetiva de contextos marcados por violências políticas ou conflitos sociais. Nos países citados, essa produção estabelece relações com as memórias das ditaduras militares por meio de histórias individuais testemunhadas por quem vivenciou essas realidades. A comunicação irá analisar três filmes brasileiros de animação: os curta-metragens documentais Torre (Nádia Mangolini, 2017) e Cadê Heleny? (Esther Vital, 2022), e o longa-metragem de ficção Meu Tio José (Ducca Rios, 2021). Produzidas integralmente com imagens animadas, as obras estabelecem uma relação tanto entre memória e animação, como entre a produção cinematográfica nacional e o atual momento político brasileiro. Nesse sentido, o filme Torre (Nádia Mangolini, 2017) apresenta os depoimentos dos quatro filhos de Ilda Martins da Silva, ex-presa política, e de Virgílio Gomes da Silva, um dos principais militantes desaparecidos pela ditadura brasileira. Com foco no resgate da experiência de infância dos protagonistas e do trauma que ela gerou, especialmente com a perda do pai, Torre aborda o tema da violência cometida pelo governo militar contra crianças e, através da animação, constrói uma visualidade da relação dos protagonistas com suas próprias memórias. Cadê Heleny? (Esther Vital, 2022), por sua vez, é uma animação sobre a história da filósofa e diretora teatral Heleny Guariba, uma militante desaparecida durante a ditadura. O filme é construído com bonecos e cenários montados com tecidos costurados, remetendo às arpilleras, arte têxtil chilena utilizada por mulheres como meio para denunciar as violências cometidas pela ditadura chilena. Em Meu Tio José, o cineasta Ducca Rios apresenta, sob a perspectiva de uma criança, a história da morte de seu tio, José Sebastião Rios de Moura, membro da Dissidência da Guanabara e participante do sequestro do embaixador estadunidense Charles Burke Elbrick, em 1969. O filme é construído com desenhos em branco e preto, e detalhes em vermelho, e conta com a atuação de voz de atores reconhecidos, como Wagner Moura e Tonico Pereira. Por meio da análise dessas produções audiovisuais, pretende-se apresentar uma reflexão sobre as implicações decorrentes da representação da memória em filmes de animação, indicando os diferentes usos, estratégias e funções que ela assume em filmes documentários e ficcionais que tratam da memória coletiva e/ou individual. Ademais, essa reflexão inclui uma análise de como a valorização da imagem animada está relacionada a mudanças na significação da imagem filmada no campo da não ficção, com o protagonismo da memória e do testemunho nos discursos contemporâneos, e a emergência de novas tecnologias e recursos expressivos nas mídias. É possível considerar que o uso de animação está conectado a uma proposta de “documentação” que acompanha a subjetivação de eventos históricos, assim como está associado com uma revisão da história das ditaduras militares latino-americanas sob o olhar das novas gerações, com produções que trazem memórias tanto dos sobreviventes das violências cometidas pelas instituições dos Estados e de seus descendentes, bem como, trabalham com o imaginário social que os países construíram sobre as ditaduras. Pode-se considerar que as obras que tratam da memória por meio da animação apresentam uma força narrativa em decorrência de este ser um formato propício a construções visuais sobre o passado, permitindo a visualização daquilo que a câmera não consegue captar, e por sua habilidade em representar temas de difícil abordagem, como casos de violência e situações traumáticas, assim como, o trabalho com a dimensão mais subjetiva da realidade e com a memória. |
|
Bibliografia | BECKMAN, K. (Ed.) Animating Film Theory. Durham: Duke University Press, 2014. |