ISBN: 978-65-86495-05-8
Título | Brasília, Pape, Papa, Pátio |
|
Autor | Patrícia Mourão de Andrade |
|
Resumo Expandido | Em 1959, Lygia Pape elaborou um roteiro para um filme abstrato sobre a construção de Brasília. Nunca realizado, o filme, do qual restam storyboards e descrições de cenas, registraria a construção da capital federal como o surgimento de uma forma sobre um plano (planalto central); trabalhadores carregando suas ferramentas deveriam ser filmados, tal como formigas, em uma tomada área, andando em fila indiana numa linha inicialmente paralela às verticais do quadro, depois em movimentos coordenados em diagonal no sentido de seu centro – coreografia abstrata que faz pensar no Balé Neoconcreto, mas também no seu Livro da Arquitetura ou Livro de Criação, espécie de narrativa da gênese construída em um livro composto por pranchas das quais emergem formas tridimensionais. Foram necessários ainda oito anos para que a artista fizesse seu primeiro filme: La Nouvelle Creation, em 1967, um found footage de não mais de quarenta segundos, com imagens do homem no espaço apropriadas da NASA. Nesse meio tempo, a artista colaborou com os principais nomes do Cinema Novo, fazendo letreiros para filmes de Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos, Leon Hirzsman e Paulo Cézar Saraceni, entre outros; além de ter feito vinhetas para a Cinemateca do MAM. Tivesse sido realizado, seu filme sobre Brasília poderia ter sido exibido ao lado de Pátio, de Glauber Rocha, e Caminhos, curta de Paulo Saraceni, hoje dado por perdido, na sessão que a artista organizou em sua casa para a estreia dos filmes no Rio de Janeiro. Dessa reunião, onde estavam presentes Lygia Clark, Amilcar de Castro, Décio Vieira, Hélio Oiticica, Ferreira Gullar, Jean Boughici, Reinaldo Jardim, Mário Pedrosa, sua filha Vera, além dos cineastas e de Helena Ignez, atriz que fazia sua estreia no cinema em Pátio, surgiu a ideia de que fosse escrito um manifesto para o Cinema Novo, a ser publicado no Suplemento Dominical do Jornal do Brasil, editado por Jardim – onde, aliás, o manifesto neoconcreto acabara de ser apresentado. Os diálogos de Pátio com o neocontretismo são já conhecidos, e foram confirmados pelo próprio Glauber, que, anos mais tarde, descreveu seu filme como “SDJB/Papa/Clarke/Brasília” – sendo SDBJ o Suplemento Dominical do Jornal do Brasil, espécie de quartel general do grupo neoconcreto; papa, possivelmente um trocadilho com Pape; Clarke, Lygia Clark, e Brasília, a utopia moderna de um projeto coletivo de uma nova sociedade. Uma cidade erguida do zero, assentada em um plano (piloto, diretor e político-social), possível através de uma síntese de todas as artes (utilitárias e nobres); uma “obra de arte coletiva”, a “remodelação e reconstrução utópica do mundo”, como descreveu Mario Pedrosa. Num esforço especulativo, esta comunicação voltará àquela sessão para imaginar os possíveis diálogos entre um filme perdido, um filme inexistente e o primeiro filme daquele que viria a ser, em pouco tempo, o grande nome do cinema moderno brasileiro. Pretende-se tomar o duplo sentido de Brasília naquele encontro – utopia erguida pela síntese das artes e filme, ou plano de filme, que não veio a ser – como paradigma para uma história das práticas artísticas com filme no Brasil erguida sobre a precariedade. Em outra chave, assumiremos o filme não feito como fio condutor para pensar a profícua trajetória de Lygia de Pape com a imagem em movimento. |
|
Bibliografia | Pedrosa, Mario. Brasília, a cidade nova. In: Arantes, Otília (org.), Acadêmicos e Modernos: Textos escolhidos III / Mario Pedrosa, São Paulo, EDUSP, 1998, p 389-404. Publicado primeiro no Jornal do Brasil em 19 de setembro de 1959. |