ISBN: 978-65-86495-05-8
Título | O Dispositivo Melodramático em "Um Céu de Estrelas (Tatá Amaral, 1996) |
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Autor | David Ken Gomes Terao |
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Resumo Expandido | No decorrer da minha pesquisa a respeito do melodrama no cinema brasileiro chego a um impasse conceitual, diante do modo como suas matrizes estético-narrativas foram absorvidas pelos meios e mediações no nosso contexto cultural. Esse impasse se refere à categoria Gênero Cinematográfico, na qual convencionalmente o melodrama se circunscreve, e cujo referencial teórico se encontra predominantemente em leituras anglófonas ou francófonas a partir de títulos clássicos norte-americanos e que acaba sendo transposta acriticamente para abordar os cinemas de outros países, sem levar em conta de que modo o sistema dos gêneros de fato estruturou suas indústrias cinematográficas e o consumo dos filmes pelo público. Nesse sentido, o Brasil se diferencia de outros países latino-americanos como México e Argentina em que o melodrama foi o elemento principal de suas filmografias, uma vez que aqui sua matriz narrativa foi secundária diante da predominância de filmes cômicos em diversos momentos de sua história, desde a chanchada até a comédia popular dos dias de hoje. Por outro lado, é flagrante o quanto o melodrama é um elemento estruturante do meio verdadeiramente massivo no Brasil: a televisão. A herança folhetinesca é estruturante tanto na telenovela quanto o jornalismo sensacionalista (sobretudo o de cunho policial). Se no primeiro caso os elementos melodramáticos são de fácil reconhecimento dentro das narrativas de filhos perdidos, dinâmicas de integração social problemáticas e maniqueísmo na caracterização da protagonista virtuosa e do vilão antagonista, no segundo caso o melodrama se refere à dinâmica de interpelação moral a partir de casos cotidianos que extrapolam o âmbito privado e se tornam públicos, com o apelo à familiaridade das situações. Se no cinema, o melodrama é um "gênero" secundário pela preferência do universo cômico da parte do público, a cotidianidade de seus códigos na televisão é algo constantemente assimilado no Brasil, sendo responsável por moldar o imaginário moral dos espectadores. Nesse sentido, proponho um conceito alternativo à ideia do melodrama como gênero cinematográfico, pensando as dinâmicas de poder que seu discurso representam no consumo de bens massivos: o Melodrama como Dispositivo. Partindo de Foucault, ele se configura como um conjunto de elementos heterogêneos que correspondem a um programa institucional ligado a uma estratégia política no jogo de poder. Já na releitura de Agamben, tal definição inclui elementos de linguagem e escrita como a literatura e as tecnologias como meios de determinação e controle discursivo e comportamental. Ao mesmo tempo em que o dispositivo se configura, discursos de contestação se formam a partir do discurso formulado por ele. O caso do Melodrama é o de um dispositivo se configura inicialmente a partir de pressupostos de moralidade e justiça que agenciam discursos oficiais e visam uma manutenção das estruturas sociais, o que é flagrante no discurso conservador fixo da exacerbação sentimental punitivista do sensacionalismo pinga-sangue, mas que é reapropriado por autores que renegociam os códigos melodramáticos a partir de agendas de resistência, como é o caso das narrativas de minorias que disputam protagonismo nos filmes e nas novelas. Para discutir essa reconceituação do Melodrama como dispositivo, escolhi trazer o filme "Um céu de Estrelas", obra marcadamente melodramática da Retomada do Cinema Brasileiro, momento em que essa estética arrefece diante da preferência pelo naturalismo violento. Nele se fazem presentes as principais dinâmicas do melodrama como a relação entre vida privada e olhar público, o uso do excesso nos elementos de encenação e o uso de um discurso romântico em chave de sensacionalismo pela via televisiva. No filme de Amaral, o dispositivo melodramático é acionado ao mesmo tempo em que é problematizado, em uma narrativa que reflete criticamente sobre temas como feminicídio, relacionamento abusivo, e a banalização midiática da violencia. |
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Bibliografia | AGAMBEN, G. O que é um dispositivo? In. AGAMBEN, G. O que é o contemporâneo? e outros ensaios. Chapecó: Argos, 2009. |