ISBN: 978-65-86495-05-8
Título | O peso espacial: hipóteses acerca do problema ontológico da atmosfera |
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Autor | Mariana Dias Miranda |
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Resumo Expandido | A palavra “atmosfera”, originalmente utilizada no sentido meteorológico, é evocada tanto pela crítica quanto pela teoria do cinema em contextos os mais diversos e gerais como, por exemplo: Susan Sontag (2015) ao definir uma “atmosfera sexual” no filme Persona (Ingmar Bergman – Suécia - 1966) ou Elena Del Rio (2008) em relação aos filmes de David Lynch como característicos de uma “atmosfera não-realista”, entre outros. Nestes dois usos exemplares, o termo aparece de modo auto-evidente e quase universal, sendo auxiliar para alguma adjetivação que implique qualidades tonais da organização espacial ou estilísticas destas obras. Desse modo, pouco se desenvolve acerca dos apontamentos formais das dimensões estéticas específicas de cada atmosfera identificada. Da mesma maneira, as características afetivas associadas a tonalidade da experiência atmosférica também acompanham essa vagueza auto-explicatória e quase acessória. Um dos principais problemas da ontologia da atmosfera é sua localização. Se esta é um humor, de quem ou onde estaria delineado? Quem e como se possui uma atmosfera? Estas são questões colocadas por Böhme (2017) ao definir o conceito como um fenômeno localizado entre sujeito e objeto, uma mediação. Neste sentido, apesar de possuírem discordâncias no modo com que operacionalizam e conceitualizam a noção de atmosfera, Böhme (2017), Gil (2005), Spadoni (2019) e Gumbretch (2014) parecem concordar na definição de um meio envolvente, um tom geral que aglutina seus diferentes elementos em uma mesma vibração de experiência espacial. A atmosfera, para estes autores, resulta da emanação de forças por parte dos objetos resultante em um tipo de impressão geral na consciência de como um determinado espaço é sentido enquanto totalidade englobante. Entretanto, mesmo que desenvolvam tipologias que visam trazer concretude formal para a atmosfera, e reforçando sua definição a partir deste lugar liminal, em última análise, oferecem como resposta o sujeito como entidade validadora do conceito: 1) Para Gil (2005, p.100): “A atmosfera geral de um filme mede-se pelas forças (afectivas, estéticas) que permanecem no espectador após o final.” 2) Böhme (2017, p.292): “Mas por outro lado atmosferas não são seres como coisas; elas não são nada sem um sujeito as sentindo.” 3) Gumbretch (2014, p.30): “O que importa, sim, é descobrir princípios ativos em artefatos e entregar-se a eles de modo afetivo e corporal - render-se a eles e apontar na direção deles.” Além do problema analítico que emerge destas definições, estas teorizações fazem forte uso das palavras “afeto” e “força”, sem que estas sejam propriamente desenvolvidas. Isto é, relega-se a atmosfera a meramente algo que “pulsa” ou transborda na imagem, sem que se defina a dinâmica especifica das afecções, questões já amplamente desenvolvidas e debatidas na teoria afetiva. É neste sentido que proponho uma rearticulação ontológica da atmosfera, partindo de um duplo movimento: 1) recuperar e problematizar, a partir da teoria afetiva - especificamente pelo conceito de “afeto-forma” (BRINKEMA, 2014) – as generalizações que envolvem a usual noção de “experiência atmosférica”. 2) retomar os conceitos de diagrama e dobra em Deleuze (1988) e associá-los a geometria dos afetos em Espinosa (2015) como hipótese analítica da atmosfera fílmica enquanto topologia de forças ordenadas espacialmente na materialidade fílmica, que ora se saturam ou se dispersam e, com isso, retira-se a experiência do sujeito como instância definidora da atmosfera. Através disso, analisa-se brevemente o filme paraguaio “Las Herederas” (Marcelo Martinessi, 2018) de modo a compreender a expressão de adensamento e saturação espacial na forma de uma atmosfera que pesa, como uma topologia de forças concêntricas na própria materialidade fílmica ligadas, nesta obra, a propriedades de paragem, letargia, destruição e melancolia. |
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Bibliografia | BÖHME, Gernot. The aesthetics of atmospheres. Nova York: Routledge, 2017. |