ISBN: 978-65-86495-05-8
Título | Ouvir o pornô: os sons e a experiência do corpo pornográfico |
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Autor | Gabriela Machado Ramos de Almeida |
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Coautor | Thiago Soares |
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Resumo Expandido | A proposta desse trabalho é pensar o lugar da escuta nos processos de produção de sentidos e sensibilidades no audiovisual de pornografia heterossexual, numa perspectiva dos estudos de gênero e sexualidades, compreendendo que parte integrante do que se chama de experiência erótico-pornográfica se dá a partir dos registros sonoros destes materiais. Aposta-se numa virada sônica no campo dos estudos da pornografia, especialmente numa chave de gênero, a partir da predominância de abordagens feministas sobre a pornografia centradas na dimensão visual (WILLIAMS, 1999; PAASONEN, 2011). Diante da constatação de que pouco se “ouve” o pornô, busca-se investigar em que medida o som presentifica a experiência do corpo pornográfico, especificamente o corpo feminino, acionando a premissa de Mowlabocus e Medhurst (2017, p. 5), de que enquanto “o orgasmo masculino é visto e o feminino é ouvido”. Para os autores, o orgasmo masculino não é contestado quando é registrado visualmente, mas os sons do sexo permanecem instáveis e inverificáveis ainda que, no caso das mulheres, seja a partir deles que o orgasmo é enunciado. Um frenesi do audível, não do visível, retomando também Linda Williams (1999). Os gemidos, a respiração ofegante, as palavras ditas, a voz frágil e oscilante contribuem sobremaneira para o reforço do framing heteronormativo da pornografia mainstream, em que a fragilidade da voz da mulher reforça uma dinâmica de aparente sujeição. A persepctiva da intangibilidade do orgasmo feminino aponta para um debate sobre a vocalidade da produção de gemidos e sussurros a partir da consagração de uma vocalidade que se dá na garganta (KOESTENBAUM, 1994). O argumento do autor é o de que a produção vocal generificada na garganta constrói historicamente noções de fragilidade e instabilidade que são performatizadas a partir de performances que podem incidir sobre fantasias de sujeição. O debate sobre performance (TAYLOR, 2013) e corpos restaurados (SCHECHNER, 2006) aponta para a consagração de sonoridades marcadamentes anglófonas no pornô mainstream. Se a expansão da pornografia de internet (netporn), conteúdo mais consumido na rede, produziu algo próximo de uma universalização do inglês como idioma principal dos maiores sites de veiculação de pornografia no mundo (como Pornhub e Xvideos), evidenciou também um empobrecimento de léxicos ligados a contextos mais localizados, tirando da cena gramáticas associadas à uma imaginação pornográfica da qual fazem parte, de forma central, expressões e gírias ligadas a práticas sexuais que só fazem sentido no contexto cultural de utilização de cada idioma especificamente. Adota-se como material empírico para análise vídeos protagonizados por Patty UPP, apelido da jovem carioca Patrícia Alves, que ficou conhecida em 2014 após a divulgação de vídeos em que aparecia praticando sexo com policiais dentro de Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) do Rio de Janeiro, além de viaturas e estacionamentos da Polícia Militar. Com a circulação do caso na imprensa e nas redes sociais, Patrícia Alves, que tatuou a sigla UPP na virilha e se dizia musa da polícia, se tornou atriz pornô e estrelou diversos filmes na produtora Brasileirinhas. Chama-se atenção para a dimensão sonora presente nesses vídeos: além da visualidade associada ao imaginário militarista tão comum como fetiche sexual (na pornografia e também fora dela), com fardas, algemas, botas e armas, os sons dos vídeos são fundamentais na construção da ambientação, da familiaridade e das condições de reconhecimento da personagem e do contexto (Brasil, Rio de Janeiro), numa dinâmica de ressonância subcultural que tem no som, não apenas na imagem, um aspecto fundamental. |
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Bibliografia | KOESTENBAUM, Wayne. The Queen's Throat: Opera, Homosexuality and the Mystery of Desire. New York: De Cabo Press, 2001. |