ISBN: 978-65-86495-05-8
Título | Reflexões sobre o espaço cênico cinematográfico. |
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Autor | TAINA XAVIER PEREIRA HUHOLD |
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Resumo Expandido | Serge Daney (2007), reconhece três fases da cenografia que dialogam com os pressupostos estéticos e programáticos dos cinemas “clássico”, “moderno” e de um terceiro tipo, que traria “o cinema como tela de fundo”. No cinema clássico, estaríamos diante da “época de ouro da cenografia”, cujo propósito principal seria a fabricação de uma “profundidade desejada”, que Léon Barsacq aponta como tendo sido introduzida pelo italiano Enrico Guazzoni (BARSACQ, 1970, p. 24) e tornada paradigma, em busca de contornar as limitações da bidimensionalidade da tela de projeção. Após a segunda grande guerra, Daney nota que algo quebra o pacto que sustentava o cinema clássico (e sua cenografia), abrindo espaço para o cinema moderno que “nasceu - não por acaso – na Europa destruída e traumatizada do pós-guerra, sobre as ruínas de um cinema enfraquecido e desqualificado, sobre a recusa fundamental da aparência, da direção, da cena.” (DANEY, 2007, p. 251) As análises de André Bazin sobre os filmes do neorrealismo revelam a busca de um cinema que expresse a poesia do real, onde “o respeito fotográfico pela unidade do espaço” (BAZIN, 1991, p. 59) ganha centralidade. Paradoxalmente, parece desdobrar-se deste exame, um apagamento da presença da cenografia, que finda por ser imiscuída no “terreno social em que ele [o roteiro do filme italiano] se enraizou” (p. 238). Desconsidera-se, portanto, seus procedimentos e artifícios, como as implicações da cenografia em “Ladrões de Bicicleta”, especialmente nos ambientes interiores, claramente adequados aos propósitos narrativos e dramáticos da representação de uma classe social determinada. Também parece pouco notada, na análise de “Umberto D”, a condição estruturante do cenário, essencial para a obtenção da fluidez das imagens que alcançam “imitação total da vida” (p. 293), que encantou o crítico. Ao examinar o espaço cinematográfico no cinema, Diogo Velasco se utiliza dos pensamentos de Gilles Deleuze e Doreen Massey para formular a categoria imagem-espaço, propondo uma aproximação deste que ultrapassasse sua determinação em torno “de uma aparência do físico, extensivo, homogêneo e superficial” (VELASCO, 2020, p. 164). Interessa, na reflexão de Velasco, tanto o reconhecimento da co-constituição do espaço com o tempo, quanto as ferramentas metodológicas propostas para se pensar uma abertura espacial no cinema moderno onde, atingindo o regime de imagens-espaço puras e diretas, “o espaço pode ser problematizado por suas várias dimensões interconectadas (estética, social, física e simbólica).” (VELASCO, 2020, p. 165) Daney aponta, como terceiro paradigma a cenografia da "visita-guiada" que, sucedendo ao advento da imagem televisiva, retorna ao exame do cinema como história e repositório. Já Oliveira Jr. aponta a relação desta cenografia com o cinema “maneirista”, onde “o fundo da imagem é sempre já uma imagem” (DANEY apud OLIVEIRA JR, 2013, p. 170). Por outro lado, a relação com as imagens já feitas, com todos filmes já filmados do cinema clássico e do cinema moderno, pode dar lugar a um olhar nostálgico, que percebe que algo se perdeu para sempre, que faz a imagem se esgarçar em outra experiência de espaço-tempo. Ao dialogar com a pergunta “Então, o barroco?” que encerra o texto de Daney, Oliveira Jr. aponta para o surgimento de um cinema do “retorno à matéria”, da “transformação da mise en scène num movimento contínuo de energias e forças.” (OLIVEIRA JR, 2013, p. 170) É partindo desta perspectiva que surge a última concepção de espaço que cotejaremos nesta revisão: a Imagem-Espaço que Antoine Gaudin propõe. Quando diferencia duas dimensões do espaço cinematográfico, o autor reconhece a diferença entre o espaço retratado (portanto, partícipe da representação e estruturante da mise-en-scène) e o espaço inscrito no corpo fílmico, “que deve ser considerada como uma estrutura físico-dinâmica primária, dentro da qual se inscreve uma interação contínua entre o vazio e a totalidade.” (GAUDIN, 2019, p. 195). |
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Bibliografia | BARSACQ, Léon. Le décor de film. Paris: Éditions Seghers, 1970. |