ISBN: 978-65-86495-05-8
Título | Borat e a construção involuntária do Mocamentário |
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Autor | Brian Hagemann |
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Resumo Expandido | O presente estudo, que é parte de meu projeto de doutorado, analisa o subgênero mockumentary a partir da análise do filme Borat! Aprendizados Culturais da América para Beneficiar a Gloriosa Nação do Cazaquistão, estrelado por Sasha Baron Cohen, (2006). O filme acompanha o personagem ficcional Borat Sagdyiev, um repórter do Cazaquistão, que sai em uma “road trip” pelos EUA entrevistando cidadãos americanos, para assim aprender sobre seu modo de vida e levar esse conhecimento de volta para seu país. O filme é uma comédia ficcional estruturada dentro do gênero mockumentary, também conhecido como fake documentary, ou falso-documentário, que consiste no desenvolvimento de um texto ficcional dentro de uma estética audiovisual documental, ou seja, ele é construído como um filme de ficção, mas é produzido todo esteticamente como se fosse um documentário. No campo acadêmico, o mockumentary ainda é relativamente pouco discutido. Apenas recentemente foram estabelecidas algumas teorias a respeito e provocadas algumas reflexões sobre o cinema, a ética no documentário e a forma que carrega a “autoridade do real” (RAMOS, 2008). A principal referência do gênero é o livro de Jane Roscoe e Craig Hight, Fading it: mock-documentary and the subversion of actuality de 2004, o qual faz uma cronologia do gênero, e procura abranger suas principais características e possibilidades. Ao analisar mais profundamente, contudo, percebi que o filme possui peculiaridades suficientes para contribuir com essas teorias por se tratar de um caso especial. Enquanto no mockumentary a mise-en-scene documental normalmente se dá desde o planejamento do roteiro até a interpretação dos atores, em Borat o roteiro é reescrito na medida em que as pessoas comuns (não-atores) sem querer, e sem perceber, interagem com a equipe de um filme de ficção, fazendo as engrenagens da narrativa rodarem dentro da diegese fílmica. Ou seja, ao contrário de outros falso-documentários onde todos os envolvidos na produção estão cientes da sua ficcionalidade, em Borat alguns não-atores acreditam estar em um documentário reagindo naturalmente ao serem entrevistados em uma mise-en-scène documental, e participam assim inconscientemente de pontos de virada do roteiro ficcional, afetando o decorrer da narrativa. Essa característica, que considero a principal, pode contribuir para abranger as teorias do mockumentary, mesmo não sendo uma estratégia comum nessa filmografia. Enquanto nos mockumentaries a ironia tem um papel fundamental no contrato “filme-espectador”, que sublinha para o receptor a ficção do texto, em Borat a ironia é trabalhada em um contrato “filme-personagem” onde não-atores envolvidos no filme interagem no contexto irônico da “Candid Camera”, enquanto o espectador já percebe se tratar de um texto ficcional, ao contrário das “vítimas” em frente às câmeras, que são mocados (enganados), o que sugere uma terminologia em português diferente para esse tipo: o mocamentário. Um paralelo dessa estratégia é visto no “Teatro Invisível”, de Augusto Boal, onde atores encenavam peças em restaurantes, ou nas esquinas, na esperança de atrair os espectadores a participar e se envolver com a ação sem saber se tratar de uma encenação. Como método de pesquisa faço um levantamento das teorias do mockumentary e do documentário para confirmar se elas abrangem as características especiais de Borat em sua forma e na esquematização genérica, dialogando ainda com o reality show, o Candid Camera e o Teatro Invisível. Também analiso as cenas em que essa participação espontânea de não-atores ocorre em Borat, e comparo suas estratégias com outros mockumentaries procurando características que se aproximem dessas citadas acima para tentar comprovar seu ineditismo estratégico. Defendo assim que o “mocamentário” Borat possui peculiaridades inovadoras para o gênero mockumentary, onde quanto mais a encenação tenta parecer, e ser, um confronto real, maior e mais transparente é a ficção que está sendo narrada. |
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Bibliografia | BOAL, Augusto. O Teatro do Oprimido e Outras Poéticas Políticas. Editora 34, 2019. |